Do coração e outros corações

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quarta-feira, 1 de julho de 2015

Nossos/as irmãos/as guarani



GUARANI KAIOWÁ
Fazendeiros incendeiam acampamento indígena no Mato Grosso do Sul
Fazendeiros armados atacaram uma comunidade Guarani Kaiowá, deixando duas crianças desaparecidas, todos os barracos carbonizados e dezenas pessoas feridas
por Cristiano Navarro


Em uma ação sem qualquer respaldo legal, fazendeiros armados atacaram um acampameto Guarani Kaiowá, no Mato Grosso do Sul, deixando duas crianças desaparecidas, todos os barracos carbonizados e dezenas pessoas feridas. O ataque contra a comunidade do Kurusu Ambá aconteceu na manhã da última quarta-feira, dia 24, no município de Coronel Sapucaia, fronteira com o Paraguai.


Em um momento de fuga e desespero, as crianças J.M, de 11 anos, e D.P, de 10 anos, desapareceram e estão sendo procuradas pela Polícia Federal.

Desde janeiro de 2007, quando a terra Kurusu Amba foi retomada, sua comunidade tem sido vítima de expulsões, assassinatos, prisões e torturas. Mesmo assim, ela resiste na luta pelo reconhecimento de seu território.

Comissão de Direitos Humanos
Na quinta-feira, dia 25, o presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal, deputado Paulo Pimenta (PT) confirmou o desaparecimento de duas crianças após o ataque contra o acampamento instalado pelos indígenas na fazenda Madama. De acordo com o parlamentar a situação segue muito tensa no local.
Depois da visita, Pimenta informou ao ministro da Justiça José Eduardo Cardozo a necessidade urgente da presença da Força Nacional na região. O ministro respondeu que aguardava pela formalização da solicitação por parte do governador do estado, Reinaldo Azambuja (PSDB). No entanto, em um documento enviado em maio ao Ministério da Justiça, Azambuja já havia requisitado o apoio das tropas federais para a manutenção da segurança na região.
Pimenta ressalta ainda que a tensão é grande e que ofensiva de fazendeiros e pistoleiros contra os guarani kaiowá pode se repetir em outras áreas ocupadas a qualquer momento.
A violenta ofensiva aconteceu no mesmo momento em que o verdadeiro proprietário da fazenda Madama havia negociado com o procurador da república Ricardo Pael a presença dos indígenas em parte da terra. Esse diálogo garantia a retirada de animais e pertences da fazenda por parte dos guarani kaiowá, momento usado pelo arrendatário Aguinaldo Ribeiro para realizar a investida. Como Ribeiro não é o proprietário da fazenda, qualquer ação de reintegração de posse ficaria inviável uma vez que o proprietário decidiu pelo acordo.

O Lugar da Cruz


Não é de hoje o costume dos fazendeiros do Mato Grosso do Sul de fazer “justiça” com as próprias mãos. A expressão usada no estado para despejos feitos assim é “limpar a área”. Utilizando seu “método de limpeza“ já há mais de uma década os ruralistas colocam o estado em primeiro lugar nos relatórios de violência contra os povos indígenas.
No início de 2007, entre os municípios de Amambai e Coronel Sapucaia, um grupo de famílias guarani kaiowá começou uma luta decidida a viver ou morrer em seu território, Kurusu Amba (Lugar da Cruz, em guarani). Naquele ano, o confronto aberto para retomar parte das terras da Fazenda Madama, em posse do fazendeiro Wilson Vendramini, deixou dois mortos e cinco guarani kaiowá feridos à bala.
A primeira tentativa de retorno ao território ocorreu em janeiro 2007. Após cinco dias ocupando uma área onde se encontra um cemitério guarani kaiowá, seguranças da empresa Gaspem, contratados por Vendramini, assumiram o papel de polícia e cumpriram uma reintegração de posse expulsando as famílias de forma violenta.
Na oportunidade, a anciã Xurete Lopes de 70 anos teve seu peito atravessado por um disparo, efetuado a um metro de distância, com arma de calibre 12. Apesar de ser provavelmente a ocupante mais indefesa do grupo, sua morte teve um importante componente político. Xurete Lopes é nhandesi (rezadora e principal líder religiosa), nascida em Kurtusu Ambá. A memória e os conhecimentos da anciã sobre a cultura e território são fundamentais para o processo de demarcação do território. Além de Xurete, um jovem foi ferido à bala durante a desocupação.
Em decorrência da ocupação, outros quatro líderes indígenas foram presos, processados e, sete meses depois, condenados a dezessete anos de reclusão pelos crimes de furto, roubo, sequestro e formação de quadrilha em uma ação penal que tramitou na 2ª Vara de Amambai. A assistência jurídica feita pelo Conselho Indigenista Missionário recorreu apontando falta de provas e características de criminalização e as lideranças foram inocentadas quase um ano depois.


Em 2009, outro líder do Kurusu Amba, Osvaldo Lopes, foi  assassinado em situação suspeita e jamais esclarecida.  Meses depois, foi a vez do jovem Osmair Fernandes, de 15 anos, encontrado morto com marcas de tortura e espancamento.

Nenhum dos responsáveis pelos assassinatos de Xurete, Ortiz, Osvaldo e Osmir ou pelas tentativas de homicídio jamais foram condenados.
Entre retomadas e expulsões, os anos seguintes não foram tão violentos quanto 2007, até esta semana de junho de 2015.
Cristiano Navarro
é editor web do Le Monde Diplomatique Brasil.


¹Jornal Bom Dia MS, 25 de junho de 2015
³ Documentário: À Sombra de um Delírio Verde: https://vimeo.com/32440717

Foto: Marcelo Christovão/ MPF
26 de Junho de 2015
Palavras chave: PovosindígenasviolênciadesenvolvimentismoKaiowáguaraniterraterritóriousina,agronegóciomegaprojeto



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