Do coração e outros corações

Do coração e outros corações

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Na Má-ringa

do blog do RIGON, na Má-ringa
AKINO

Maringá não tem prefeito

Poderia estar falando do fato do TSE ainda não ter decidido quem é, de direito, o Prefeito de Maringá. Mas muitos poderão dizer que o prefeito continua sendo Ricardo Barros, como aconteceu nesses últimos oito anos. Cheguei à conclusão que ele não é o prefeito de fato, mas se considera e age como ‘dono do município’. Se apoderou de tal forma que exerce o direito de usar parte do dinheiro do contribuinte para distribuir para 515 privilegiados, ao seu bel prazer. Desses no máximo 150 terão o que fazer. Os demais serão remunerados com base em verdadeira apropriação indébita, na mão grande.
Mas não é só isso. Como dono ele mandou desapropriar, comprar e vender terrenos para o parque industrial Barros. Modifica o Plano Diretor da maneira que quiser. Concedeu 40 anos para a TCCC. Mandou derrubar a rodoviária velha. Faz e desfaz na destinação do lixo. Está certo que ainda não conseguiu (na verdade recuou para não atrapalhar a eleição) instalar a usina de queima, num negócio milionário em que o contribuinte pagaria para entregar a matéria prima. Vejam que negócio da china. Doaríamos a matéria prima para a geração de energia e ainda pagaríamos um alto preço.
Como dono da cidade ele faz o que quer na Câmara e temendo desobiência de alguns de 11 (futuros) vereadores que pretende sejam marionetes em suas mãos,teria elaborado um código de ética, ou de conduta, digno das maiores máfias e pccs da vida. Todos se comprometem a votar e fazer tudo o que ele mandar. Quem desobedecer pode sofrer represálias que vão até a cassação. Todos teriam sido instados a assinar o documento.
Por essas e outras é que, ao contrario do que pensava, Maringá não tem prefeito, tem um dono.
Akino Maringá, colaborador

domingo, 23 de dezembro de 2012

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23.12.12 do Blog de Joana Lopes, Portugal

«Em defesa» de Gérard Depardieu



Corre tinta sobre a emigração de Gérard Depardiu para a pequena vila de Néchin, na Bélgica, para escapar a uma recente lei do fisco francesa, que taxa a fortuna dos ricos em 75%. Numa carta publicada há uma semana, o actor responde ao primeiro-ministro que lhe tinha chamada «miserável»(«minable», em francês). 

Como bem frisa Luís Menezes Leitão, «se a França tributasse Depardieu a uma taxa na ordem dos 40% ficaria seguramente com 40% dos milhões que ele ganha. Ao subir essa taxa para 75% verá todo esse dinheiro ir para outras paragens».

Mais, e sobretudo: «a ganância nunca foi boa conselheira e a ganância fiscal ainda o é menos» – nós que o digamos... Numa escala (invejosa?) bem diferente da de GD, que atire a primeira pedra quem não gostaria de poder escapar à voragem tributária de Gaspar and friends(masoquistas e fanáticos à parte). Estes governos europeus, desorientados, recusam-se a fazer acertada e eficazmente o trabalho de casa: atiram, atiram, mas acabam por dar muitos tiros na água, nunca acertam no porta-aviões e só afundam submarinos.

Alguns excertos da carta enviada por Depardieu ao primeiro-ministro:

Miserável, disse «miserável»? Como isso é miserável

Nasci em 1948, comecei a trabalhar com a idade de 14 anos como tipógrafo, como operário de manutenção, como artista dramático. Paguei sempre os meus impostos, independentemente das taxas, com todos os governos.

Em nenhum momento, falhei nos meus deveres. Os filmes históricos em que participei mostram o meu amor pela França e pela sua história. (...)

Parto depois de pagar, em 2012, 85% de impostos sobre o que recebi. Mas conservo o espírito desta França que era bela e, espero, assim permanecerá.

Entrego-lhe o meu passaporte e a minha Segurança Social que nunca usei. Não temos já a mesma pátria, sou um verdadeiro europeu, um cidadão do mundo, como o meu pai sempre me ensinou. (...)

Nunca matei ninguém, não me considero indigno, paguei 145 milhões de imposto em 45 anos, tenho 80 pessoas que trabalham em empresas que foram criadas por elas e que são por elas geridas.

Não pretendo que me lamentem ou me elogiem, mas recuso a palavra «miserável».

Quem é você para me julgar assim, pergunto-lhe senhor Ayrault, primeiro-ministro do senhor Hollande, pergunto-lhe, quem é você? Apesar dos meus excessos, do meu apetite e do meu amor pela vida, sou um ser livre e vou permanecer educado.

Gérard Depardieu 

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Giorgio Agamben, sobre Duchamp:

"Duchamp talvez tenha sido o primeiro a dar-se conta do beco sem saída em que a arte se meteu. O que faz Duchamp quando inventa o ready-made? Ele toma um objeto de uso qualquer, por exemplo, um vaso sanitário, e, introduzindo-o num museu, o força a apresentar-se como obra de arte. Naturalmente - a não ser o breve instante que dura o efeito do estranhamento e da surpresa – na realidade nada alcança aqui a presença: nem a obra, pois se trata de um objeto de uso qualquer, produzido industrialmente, nem a operação artística, porque não há de forma alguma uma poiesis, produção – e nem sequer o artista, porque aquele que assina com um irônico nome falso o vaso sanitário não age como artista, mas, se muito, como filósofo ou crítico, ou, conforme gostava de dizer Duchamp, como “alguém que respira”, um simples ser vivo.

Em todo caso, certamente ele não queria produzir uma obra de arte, mas desobstruir o caminhar da arte, fechada entre o museu e a mercadorização. Vocês sabem: o que de fato aconteceu é que um conluio, infelizmente ainda ativo, de hábeis especuladores e de “vivos” transformou o ready-made em obra de arte. E a chamada arte contemporânea nada mais faz do que repetir o gesto de Duchamp, enchendo com não-obras e performances a museus, que são meros organismos do mercado, destinados a acelerar a circulação de mercadorias, que, assim como o dinheiro, já alcançaram o estado de liquidez e querem ainda valer como obras. Esta é a contradição da arte contemporânea: abolir a obra e ao mesmo tempo estipular seu preço".

Via facebook, supefícies: dos poros ao sopro.

Hoje acordei assim...

Não tenho os créditos da bela fotografia. Cap-tirei do Facebook de Pedro Maciel.

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2013....


Em 2013 ... meu desejo é que não nos percamos no mundo das mercadorias, ou melhor, resgatemos, outras realidades que não a do mercado. A realidade das artes, da música, a dos sonhos, a realidade das pessoas simples, a das redes subjetivas que nos fazem... a do nosso renascimento como seres humanos, sempre incompletos, criativos...

Abraços a Roberto Romano, Leonardo Ferrari, Belkiss, Patrícia Lessa, Julia, Cristina, Carlos Mororó, Solda, Sponholz e todos e todas aquelas que entram nesse blog acompanhando fragmentos,cacarecos...

BOM 2013!



segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

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Na Má-ringa corre a notícia de que o abrigo das mulheres (abrigo municipal) cederá lugar para abrigo de crianças porque aqui na Má-ringa não há problema de violência contra mulher. O Coletivo Feminista está ativando o debate. Mais uma da administração da Má-ringá. 

Jornal Todo Dia, via Jornal da Unicamp

do Blog de Roberto Romano

CAMPINAS
Violência psicológica atinge mais mulheres
Em dez anos, foram 2.541 casos deste tipo contra o sexo feminino, 50% do total de registros no Ceamo
RAONI ZAMBI - CAMPINAS

          Arquivo | TodoDia Imagem
Reunião do Ceamo, de Campinas, que atende mulheres vitimizadas
A violência psicológica contra mulheres em Campinas foi a ocorrência que mais teve registros no Ceamo (Centro de Referência de Apoio à Mulher), ligado à Secretaria de Assistência Social. Em dez anos, foram 2.541 casos, o que representa 50% dos atendimentos. A coordenadora da entidade, Juliana Rodrigues de Sousa Fanelli, relatou que esse tipo de ataque costuma resultar em outros tipos de violência. No total, foram 5.082 atendimentos.
Em segundo lugar vem a violência física, com 1.787 registros, seguida pela violência moral, com 361 ataques. O Ceamo ainda registrou 211 casos de violência patrimonial e 182 ocorrências de violência sexual.
A pesquisadora sobre violência e professora doutora da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) Áurea Maria Guimarães relatou que a violência psicológica costuma ser “sutil” e causar danos “terríveis”. Ameaças de morte ou de agressão física, ofensas e gritos estão entras os itens que podem ser considerados como ameaça psicológica.
“Em muitos casos, a violência psicológica costuma ser difícil de ser percebida e isso dificulta a tomada de decisões por parte da mulher. A família em muitos casos não entenderia um pedido de separação porque a mulher é agredida verbalmente. No entanto, esse tipo de agressão também causa danos negativos para a vida de uma pessoa “, explicou.
A DDM (Delegacia da Mulher) de Campinas informou que em casos de violência psicológica o recomendado é fazer um BO (Boletim de Ocorrência) e representar no MP (Ministério Público). Muitos casos de ameaça acabam se tornando realidade.
ATENDIMENTO
Juliana explicou que no primeiro atendimento as mulheres vítimas de violência são orientadas a retornar para acompanhamento realizado entre três e quatro vezes por mês, por um período médio de seis meses a dois anos. O Ceamo realiza por mês aproximadamente 150 atendimentos.
A mulher vítima de violência, depois que procura o Ceamo, recebe atendimento psicológico, social e orientação jurídica, com objetivo de romper o ciclo da violência por meio de atendimento individual, familiar ou em grupo. As profissionais do órgão realizam, quando necessário, visitas domiciliares e atendimentos nos diversos espaços da rede, na região onde reside a vítima e quando há qualquer impedimento
LIXO
A promotora de vendas, S.J.A., 32, relatou que se separou por ser vítima de violência psicológica. O ex-companheiro a ameaçava de morte e dizia que ela não prestava para nada. “Em muitos casos a agressão verbal é pior do que apanhar. Quando meu ex-marido dizia que eu não servia para nada, literalmente me sentia um lixo. A minha autoestima ficou muito abalada. Hoje, vivo com meu filho de cinco anos e sou muito feliz”, disse.
A copeira S.M.S., 32, contou que nunca apanhou do marido, mas foi vítima de cárcere privado e de ameaças. “Se a pessoa ameaça de morte, uma hora acaba fazendo. Como dependia do meu ex-marido para muita coisa, não podia tomar uma decisão mais radical. Por muito tempo aguentei um monte de humilhações. Hoje, graças a Deus consegui me libertar”, contou.

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Gente, cores, bichano, galo ...


Arthur Bispo do Rosário




do Blog Diário do centro do mundo

Michael Moore: “Do que temos tanto medo para ter 300 milhões de armas em casa?”
MICHAEL MOORE 15 DE DEZEMBRO DE 2012 3
O cineasta americano tenta explicar por que assassinatos em massa nos EUA são tão comuns


A semi automática “Bushmaster .223″, uma das três armas usadas por Adam Lanza, o assassino de Newtown
Michael Moore escreveu esse texto por ocasião da chacina no cinema de Aurora, no estado do Colorado, em julho. Por continuar terrivelmente atual, o Diário o republica hoje.

Desde que Caim enlouqueceu e matou Abel, sempre houve aqueles seres humanos que, por uma razão ou outra, temporariamente jogavam vítimas de um penhasco na ilha mediterrânea de Capri. Gilles de Rais, um cavaleiro francês aliado de Joana D’Arc durante a Idade Média, ficou maluco e acabou assassinando centenas de crianças. Apenas algumas décadas mais tarde, Vlad, o Empalador, inspiração para Drácula, estava assassinando pessoas na Transilvânia de inúmeras maneiras terríveis.
Nos tempos modernos, quase todas as nações tiveram um psicopata ou dois para cometer um assassinato em massa, independentemente de quão rigorosas as leis fossem – o adepto da supremacia branca na Noruega há um ano, o açougueiro na escola em Dunblane, na Escócia, o assassino da Escola Politécnica em Montreal, o assassino em massa em Erfurt, Alemanha… a lista parece interminável.
Sempre houve pessoas insanas, e sempre haverá.
Mas aqui está a diferença entre o resto do mundo e nós: temos dois Auroras que acontecem todos os dias de cada ano! Pelo menos 24 norte-americanos por dia (8-9 mil em um ano) são mortos por pessoas armadas – sem contar os mortos por acidente e os que cometem suicídio. Se você incluí-los, pode triplicar esse número para mais de 25 mil.

Isso significa que os Estados Unidos são responsáveis ​​por mais de 80% de todas as mortes por arma de fogo nos 23 países mais ricos, combinados. Considerando-se que as pessoas desses países, como seres humanos, não são melhores ou piores do que qualquer um de nós, bem, então, por que nós?
Conservadores e liberais operam com crenças firmemente mantidas em relação ao “porquê” do problema. O motivo de não encontrarem a solução é que ambos estão certos pela metade.
A direita acredita que os Pais Fundadores, através de uma espécie de decreto divino, garantiu o direito absoluto de possuir armas. E eles vão incessantemente lembrar que uma pistola não pode ser disparada sozinha – “armas não matam pessoas, pessoas matam pessoas”.
Claro que eles sabem que estão sendo intelectualmente desonestos com relação à Segunda Emenda, porque têm ciência de que os homens que escreveram a Constituição só queriam ter certeza de que uma milícia poderia ser rapidamente organizada entre agricultores e comerciantes, caso os britânicos decidissem voltar e causar alguns estragos.
Mas eles estão certos pela metade quando dizem: “armas não matam pessoas.” Gostaria apenas de alterar um pouco esse slogan para falar a verdade: “Armas não matam pessoas, americanos matam pessoas”.
Porque nós somos os únicos no Primeiro Mundo que fazem isso em massa. E você vai ouvir americanos de todas as faixas com uma série de razões para explicar por que não querem lidar com o que está realmente por trás de tudo isso.
Eles dizem que filmes violentos e games são responsáveis. Da última vez que verifiquei, os filmes e games no Japão eram mais violentos que os nossos – e, mesmo assim, menos de 20 pessoas por ano são mortas por lá com armas. Em 2006, foram duas!
Outros dirão que é o número de lares desfeitos que leva a toda essa matança. Eu odeio discordar, mas há quase tantos lares monoparentais no Reino Unido como por aqui – e, ainda, na Grã-Bretanha, há menos de 40 assassinatos por ano por armas de fogo.

Pessoas como eu vão dizer que esse é o resultado de os EUA terem uma história e uma cultura de homens armados, “caubóis e índios”, “atirar primeiro e perguntar depois.” E se é verdade que o genocídio em massa dos nativos americanos definiu um modelo muito feio para fundar um país, eu acho que é seguro dizer que nós não somos os únicos com um passado violento ou uma propensão para o genocídio. Olá, Alemanha! É isso mesmo que eu estou falando sobre você e sua história, dos hunos aos nazistas, sempre amando um bom massacre (assim como os japoneses e os ingleses, que governaram o mundo por centenas de anos – e não conseguiram isso através de plantio de margaridas). Ainda na Alemanha, uma nação de 80 milhões, existem apenas cerca de 200 assassinatos por ano.
Então, esses países (e muitos outros) são como nós – exceto pelo fato de que mais pessoas aqui acreditam em Deus e na igreja do que qualquer outra nação ocidental.
Meus amigos liberais vão dizer que, se nós tivéssemos menos armas, haveria menos mortes por armas. E, matematicamente, isso seria verdade. Se você tiver menos arsênico na água, ele vai matar menos pessoas. Menos de cada coisa ruim – calorias, tabagismo, reality shows – vai eliminar muito menos pessoas. E se tivéssemos leis fortes proibindo a venda de automáticas e semi-automáticas e de revistas especializadas que contêm um zilhão de balas, bem, então atiradores não seriam capaz de atirar em tantas pessoas em apenas alguns minutos.
Mas aí, também, existe um problema. Há uma abundância de armas no Canadá (em sua maioria espingardas de caça) – e, mesmo assim, o número de assassinatos anuais é de cerca de 200. Na verdade, por causa de sua proximidade, a cultura do Canadá é muito semelhante à nossa – as crianças jogam os mesmos games violentos, veem os mesmos filmes e programas de TV e ainda assim não crescem querendo matar umas as outras. A Suíça tem o terceiro maior número de armas de fogo por habitante na Terra, mas ainda assim uma taxa de homicídios baixa.

Então – por que nós?
Fiz essa pergunta há uma década no meu filme ‘Tiros em Columbine’. Isso é o que eu disse então e é o que vou repetir hoje:
1. Nós, americanos, somos assassinos incrivelmente bons. Nós acreditamos na morte como uma forma de atingir nossas metas. Três quartos dos nossos estados executam criminosos, mesmo que as menores taxas de homicídio estejam geralmente em estados sem pena de morte.
É a nossa forma atual de enfrentar seja o que for que estejamos temendo. É invasão como política externa. Claro que existe o Iraque e o Afeganistão – mas temos sido invasores desde que conquistamos o Velho Oeste e agora estamos tão viciados nisso que não sabemos onde invadir (bin Laden não estava escondido no Afeganistão, mas no Paquistão) ou por que invadir (Saddam tinha zero armas de destruição em massa e nada a ver com o 11 de setembro). Enviamos nossas classes mais baixas para fazer a matança e o resto de nós, que não tem um ente querido por lá, não gasta um único minuto de qualquer dia pensando sobre a carnificina. E agora nós enviamos aviões não-tripulados a regiões remotas para matar, aviões controladas por homens sem rosto em um exuberante estúdio com ar-condicionado no subúrbio de Las Vegas. É uma loucura.
2. Nós somos um povo facilmente assustado e é fácil manipular-nos com o medo. Do que temos tanto medo para ter 300 milhões de armas em nossas casas? Quem é que achamos que vai nos machucar? Por que a maioria dessas armas está nas mãos de brancos em casas de subúrbio e nas áreas rurais? Talvez devêssemos resolver o nosso problema de racismo e nosso problema de pobreza e então houvesse menos gente frustrada, assustada e furiosa. Talvez nós devêssemos cuidar melhor de nós mesmos.
Tudo o que está faltando aqui, meus amigos, é coragem e determinação. Estou nessa se você estiver.

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Amar-te Assim Perdidamente

"Amour", de Michael Haneke
Amour”, de Michael Haneke
Amour” é um dos mais lúci­dos, sere­nos e ter­rí­veis poe­mas de amor da his­tó­ria do cinema. Geor­ges e Anne (Jean-Louis Trin­tig­nant e Emma­nu­elle Riva, dois sím­bo­los vivos do cinema fran­cês) são um casal de octo­ge­ná­rios refor­ma­dos. Anti­gos pro­fes­so­res de música, gozam uma exis­tên­cia con­for­tá­vel num espa­çoso apar­ta­mento de Paris. Mas Anne sofre um AVC, que a para­lisa do lado direito e a torna depen­dente dos cui­da­dos do marido. Acon­tece um segundo aci­dente car­di­o­vas­cu­lar, o cére­bro é afec­tado, surge a demên­cia pro­gres­siva, e Geor­ges, pouco a pouco, dá por si a habi­tar com a débil som­bra da mulher que amou, e que con­ti­nua a amar. “Amour” é um filme ines­pe­rado na car­reira de Michael Haneke. O aus­tríaco, um dos mai­o­res cine­as­tas con­tem­po­râ­neos,  tem o pes­si­mismo como “modus ope­randi” e a perda como ter­ri­tó­rio de elei­ção: a perda de equi­lí­brio fami­liar (o sui­cí­dio colec­tivo de “O Sétimo Con­ti­nente”, 1989), a perda da segu­rança do lar (a tor­tura caseira em “Funny Games”, 1997), a perda de vasos comu­ni­can­tes entre paí­ses, reli­giões, etnias (“Código Des­co­nhe­cido”, 2000), a perda do Eu (“A Pia­nista”, 2001), a perda de tole­rân­cia para lidar com a memó­ria (a obra-prima “Caché”, 2005). Ao longo desse cami­nho, Haneke vai patru­lhando as fron­tei­ras da mora­li­dade. “Amour” man­tém a perda como cen­tro,  mas é o pri­meiro filme de Haneke onde a com­pai­xão triunfa. Aos 70 anos, ele chama dois acto­res que se tor­na­ram vede­tas na década de 50, concentrando-se na velhice e, pela pri­meira vez, o seu olhar ama a coisa olhada: Geor­ges cuida de Anne, ouve-a, cala-a, incentiva-a, leva-lhe a comida à boca, ajuda-a a levantar-se da sanita, limpa-lhe os len­çóis, muda-lhe as fral­das, e a sua deli­ca­deza, a sua revolta, a sua tran­qui­li­dade, o seu deses­pero ape­nas refor­çam o amor que por ela sente. Trin­tig­nant mostra-se de uma jus­teza impe­rial, Riva é sim­ples­mente extra­or­di­ná­ria e, com eles — por eles — Haneke sus­pende a crença na irre­du­tí­vel per­ver­si­dade do ani­mal humano, concedendo-lhe o bene­fí­cio da dúvida, às por­tas da morte. Trata-se de um pequeno mila­gre. E de um grande filme.

Publi­cado na revista “Sábado”

Ruas, cidades coloridas e belas...


Sublime!


Projeto Heidelberg

O projeto Heidelnerg nasceu em 1986 pelas mãos do pintor Tyree Guyton e seu avô Sam Mackey. O objetivo da dupla era melhorar a aparência do bairro (no leste de Detroit) que estava completamente deteriorado. E os dois escolheram fazer isso da forma mais divertida e interessante do mundo. Suas intervenções transformam casas e ruas em verdadeiras galerias ao ar livre. Há quem ache bizarro. Eu não acho nem um pouco. Cadê o humor dessa gente? A intenção não é só colorir e lotar as casas de penduricalhos. O projeto envolve toda a comunidade, crianças, adultos, cachorros… todo mundo se envolve, colabora. É um exercício que estimula a criatividade, treina o olhar, envolve grupos, sensibiliza as pessoas. Enfim, é maravilhoso! Assistam o vídeo no fim do post que vão entender melhor. Hahahaha.
Tcharam!

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Um buracão ronda a Universidade Estadual de Maringá....

Modernidade na Má-ringá é um giro para trás fingindo que se anda para frente. Na frente estaria o futuro. Futuro da sustentabilidade, de cidades com menos carros e mais metrôs, mais ônibus, mais bicicletas. No lugar do futuro, na Má-ringa, temos a onda verde (semáforos sincronizados para dar vazão aos carros), ciclovias que funcionam meia boca, o tal do centro novo da cidade que virou um centro de espigões cuja densidade populacional aumenta (e que tínhamos um projeto de Oscar Niemeyer, hoje no lixo), árvores cortadas sobretudo na frente de lojas de empresários amigos... 

Depois de tornar Maringá na Má-ringa, agora nessa cidade, outrora verde, teremos o primeiro buracão. Buracão, sim, como aqueles que Maluf fez em São Paulo, no centro, para mostrar a modernidade paulistana.  Mas aqui o buracão tem mais buraco: a administração Barros/Pupin, empresários locais, querem transformar a única universidade pública da cidade em uma via para carros. Para não desmanchar a Universidade em pedaços a céu aberto, os empresários políticos vão despedaçá-la por baixo. Um estupro, na minha opinião. Trezentos milhões serão gastos para dar vazão ao que o mundo  mais civilizado cada dia mais substitui, os carros. A Universidade Estadual de Maringá que nunca foi bem vista pelos empresários/políticos porque não aceita como cordeiro o sacrifício "moderno" dos milhões das construtoras modernas, é quase uma refém do prefeito e do futuro prefeito da cidade. Modernos prefeitos. Cuidam das empresas, dos carros, dos gados...  jogam fora cultura, livros, alegria, solidariedade, ambiente sustentável... gente!

Como é a Má-ringá?

1 - não temos parques ou praças públicas que acolham a população. Eventos são feitos em pequenas praças como a da catedral que, depois da reforma moderna, ficou mais impermeabilizada, mais calorenta. Ou são feitos em espaços de empresas como foi feita a bonita apresentação da TV Globo na segunda-feira passada. Mas, coisa pública para o público? Não, essa é uma cidade moderna.

2 - não temos teatros ativos ou de fácil acesso à população. Nem bibliotecas, nem museus. As bibliotecas são pequenas para manuseio da população estudantil mais pobre.  Museus? Só o de horrores. Não preciso nomear aqui um deles onde guardas não nos deixam falar, nos manifestar...

3 - ciclovias? Foram feitas em algumas avenidas e a moda não pegou. 

4 - cheia de carros, corre a cidade em busca de maior vazão para .... os carros. Não se faz uma cidade para a população toda, pobre, média, rica... se faz a cidade para quem tem carros. Por que no lugar do buracão por baixo da Universidade não se faz um metrô? 

Bem, o que é esse buracão? Um buraco que atravessa a cidade via centro onde localizam-se lojas e atualmente a PUC, PR, para outros locais onde se localizam empresas e outras universidades privadas. Para isso mata-se a única universidade pública. Isso mostra que o projeto tem um quê de VINGANÇA,  um que de MESQUINHARIA, um monte de "queS" para os empresários amigos. 

O BURACO é uma rota para ajudar os empresários amigos a circular trabalhadores e mercadorias, alunos e donos de carros. A justificativa é a vazão de carros. Mas, a vazão deve ser de pessoas e não de carros. E pessoas podem andar de metrô, que é mais moderno. Podem ir a teatros. Mas, não! Em terra de empresários quem não faz buraco não gasta R$300 milhões de reais. Para começar. Porque sabemos que no fim sempre essas empreitadas são mais caras. É o resgate do malufismo na Má-ringa!

Para mim esse buraco vem de uma confraria do dinheiro, da feiura estética, da morte da tradição da Universidade. 









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22 de fevereiro, 2011 – O Ex-tado do Paraná 

do SOLDA

Do Blog de Roberto Romano

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

A Má-ringá!

MEMÓRIA

Maringá engavetou Niemeyer

Resgatado pelo Maringalidades, este texto de Carlos Henrique Braga foi publicado originalmente na edição 106 do Jornal da UEM:
O Novo Centro de Maringá seria uma praça modernista de uso público e edifícios arrojados se o Projeto Ágora, do arquiteto Oscar Niemeyer, encomendado nos anos 1980, tivesse ido adiante. A estudante da UEM, Jeanne Christine Versari, estudou as duas versões do projeto, de 1986 e 1991. Seu artigo de iniciação científica ganhou menção honrosa da Federação Nacional dos Estudantes de Arquitetura e Urbanismo (Fenea), no último mês. Segundo sua coordenadora, a professora Fabíola Castelo de Souza, o projeto pode não ter passado de estratégia de marketing da cidade. A concepção inicial foi encomendada a Niemeyer pelo prefeito Said Ferreira (1983-1988), em 1986, para reocupar o espaço de três glebas, medindo cerca de 200 mil metros quadrados, que fora pátio de manobra de trens e estação ferroviária.
Ele propôs uma ágora (praça, em grego) futurista com torres para hotéis de luxo e condomínio, escritórios, lojas e shopping. “Era um projeto absolutamente modernista”, qualifica a coordenadora, “em relação à cidade, seria muito distinto”. Para erguer o que foi imaginado pelo criador de Brasília, a prefeitura criou a Urbamar, empresa de economia mista.
“A imagem anunciada pela gestão municipal procurava reforçar a ideia de modernidade que seria imposta por meio de um projeto para a área central, o qual possibilitaria o progresso e o desenvolvimento econômico da cidade”, traz o artigo O Projeto Ágora: proposta de Niemeyer para a primeira reestruturação da área central de Maringá, Paraná, co-orientado pelo professor Aníbal Verri Júnior.
Grande demais – De tão inovador, o projeto “não coube’ na Maringá da época. Talvez, não estivesse nos planos da prefeitura tirá-lo do papel. “[O Ágora] era uma grande peça de marketing, saia muito caro construí-lo”, diz a professora Fabíola.
De concreto, só o rebaixamento da linha férrea, que tornou possível ligar o norte e o sul da cidade, e a maquete guardada na prefeitura. Os lotes foram vendidos e o dinheiro usado na abertura das avenidas Duque de Caxias e Herval, como parte da adaptação do plano, em 1991, na gestão de Ricardo Barros (1989-1992). Dois anos depois, o projeto é rebatizado como Novo Centro e não sobra nada do traço de Niemeyer.
Para a professora, é mais um exemplo de projeto grandioso que surpreende pelo tamanho e acaba encalhado. “A gente tem uma crítica a esses grandes projetos, que encantam as pessoas, mas depois a gente só vê uma transferência de áreas para o patrimônio privado”, analisa Fabíola. Esse tipo de manobra do poder público, acredita, favorece a especulação imobiliária. “No final, não se faz nada para o uso público”.
Na análise de Jeanne, que disputou a menção honrosa da Fenea com outros nove artigos, apesar de o projeto de Niemeyer não se integrar à cidade, Maringá perdeu “uma grande oportunidade de usar esse espaço público”, que ainda continua parcialmente desocupado.
O trabalho foi exposto no 36º Encontro Nacional de Estudantes de Arquitetura, em Salvador (BA). Para escrever o artigo, Jeanne pesquisou acervos públicos, como os do Museu da Bacia do Paraná, notícias da época, recortes de revistas e fotografias. Nessa garimpagem, ela se deparou com uma entrevista do criador do Ágora à Revista Tradição, em 1987. “Nossa preocupação”, disse Niemeyer à publicação, “ao projetar essa grandiosa área no centro de Maringá foi, antes de tudo, criar um novo espaço verde, humanizando, fazendo a cidade respirar melhor”.
A estudante teve a bolsa renovada pelo CNPq e Fundação Araucária, por mais um ano, e vai continuar debruçada sobre o sonho de Niemeyer.

A rebelde líbia que fugiu da revolução que ajudou a fazer

por KIKO NOGUEIRA 5 DE DEZEMBRO DE 2012 

Magdulien Abaida lutava pelos direitos das mulheres de seu país. Foi presa e depois espancada



Magdulien Abaida é uma moça bonita de 25 anos, com uma história como ativista das forças rebeldes que derrubaram o ditador da Líbia Muamar Gadafi. Deveria estar, neste momento, desfrutando da glória de ter ajudado a revolução em seu país e batalhando para reconstruí-lo. Mas não é isso o que acontece. Magdulien fugiu e acabou de ter seu pedido de asilo acatado no Reino Unido.
Filha de um advogado, ela cresceu em Trípoli, a capital. Durante os protestos, foi ao Cairo e a Paris para organizar o envio de medicamentos e alimentos para os rebeldes. Quando Gadafi caiu, mudou-se de volta a Trípoli para lutar pelos direitos das mulheres na nova constituição, que estava sendo escrita. Magdulien estava preocupada com os fundamentalistas islâmicos. Em outubro do ano passado, Mustafa Abdul Jalil, a face mais conhecida entre os revoltosos, falou, em seu primeiro discurso, sobre sua proposta de facilitar aos homens que tivessem mais de uma mulher.
No meio do ano, numa visita à segunda maior cidade do país, Benghazi, onde participava de uma conferência, Magdulien foi presa por membros de uma das milícias que se espalharam pela Líbia. Eles a capturaram em seu quarto de hotel. Foi detida, libertada, e no dia seguinte presa novamente na base da milícia.
“Nós queríamos mais direitos, não a destruição dos direitos de metade da sociedade”, disse para a BBC. “Alguém entrou na minha cela e começou a me chutar. Me bateu com sua arma, dizendo: ‘Vou matar você e te enterrar num lugar que ninguém vai saber qual é’. Me chamou de espiã de Israel, puta e vagabunda’”.
Com marcas de espancamento e temendo ser assassinada, Magdulien voou para a Inglaterra em setembro.
Seu caso está longe de ser isolado. Segundo a Anistia Internacional, as milícias armadas estão descontroladas, prendendo e torturando quem eles querem. O novo ministro da Justiça, Salah Marghani, ex-advogado especializado em direitos humanos, declarou que a Líbia precisa por um fim nos abusos, particularmente em prisões e centros de detenção.
“É muito triste se colocar em risco pela revolução e, no final, você ter de ir embora porque seu país não é mais seguro”, afirma Magdulien, que continuará sua campanha — mas a partir da cidadezinha de Sunderland. “Todos estávamos unidos, trabalhando juntos, mas agora ficou difícil. Se eles me pegarem outra vez, tenho certeza de que não serei solta nunca mais”.

No fim...



Dedicatórias e cartas encontradas em livros revelam histórias emocionantes que mexem com corações e mentes de donos de sebos do Rio

Publicado: 25/11/12 - 19h01
Atualizado: 25/11/12 - 19h02

Sylvio Massa e a foto da mulher. No sebo Baratos da Ribeiro, ele reencontrou a dedicatória que escreveu para a falecida esposa em um livro de J.D. Salinger, em 1966 Leonardo Aversa / Agência O Globo
RIO - Era uma noite de terça-feira insuspeita em Copacabana. No fim daquele dia, 23 de outubro, um grupo de frequentadores do sebo Baratos da Ribeiro faria exatamente o que faz há cinco anos: se espremeria entre as prateleiras abarrotadas da livraria para mais um encontro do Clube da Leitura, evento quinzenal em que leem trechos de livros e trocam impressões sobre contos próprios. Quando chegou a sua vez na roda, o dono do sebo e fundador do clube, Maurício Gouveia, tirou da gaveta um livro que guardava há dez anos escondido no acervo: um exemplar em italiano de “Nove contos”, do escritor americano J.D. Salinger.
Não tinha coragem de vendê-lo. Com as bordas amareladas e as páginas carcomidas, aquele “Nove racconti” guardava uma dedicatória em português na página de rosto que Maurício considerava mais bonita do que todo o livro do autor do clássico “O apanhador no campo de centeio”. Um homem comum — que poderia ser um médico, um vendedor de sapatos ou um trapezista de circo — declarava seu amor a uma mulher, em Milão, em 26 de dezembro de 1966. Maurício leu a dedicatória enorme, que começava com a frase “De tudo que vem de você, permanece em mim uma vontade de sorrir” e se encerrava com a oração “a vida é um contínuo chegar de esperanças”. Ao final, subiu o tom para ler o nome do santo: Sylvio Massa de Campos.
Foi quando um dos frequentadores do clube soltou um “opa!”. O jornalista George Patiño conhecia a família Massa, da qual Sylvio era o patriarca. Ele não vendia sapatos, trabalhava em circo ou morava em Milão: o matemático e escritor Sylvio Massa de Campos estava vivo, trabalhara a vida toda na Petrobras, tinha 74 anos e morava logo ali, no Leblon.
— Tem certeza? — perguntou Maurício.
— Trago ele aqui no próximo encontro — prometeu George.
Feito. No dia 6 de novembro, um senhor de cabelos brancos, sorriso fácil e porte altivo entrou no sebo acompanhado de duas filhas e três netos. Emocionado, recebeu das mãos de Maurício o livro perdido. Releu a dedicatória em voz alta, com pausas longas entre uma frase e outra, o que só aumentava o suspense na livraria, entrecortado pelo ruído dos netos inquietos. Depois de ser longamente aplaudido, contou aos novos colegas a história por trás daquela mensagem.
Em 1966, ele fazia mestrado em Matemática em Milão com uma bolsa do governo brasileiro. Lá, conheceu uma italianinha de nome Febea, que tinha concluído os estudos em Literatura em Londres, e acabava de retonar à Itália. Quando ela comentou que conhecia José Lins do Rego e João Cabral de Melo Neto, e que adoraria aprender português para ler Guimarães Rosa, Sylvio se apaixonou na hora: apesar de trabalhar com algoritmos, era na literatura que descansava seus teoremas. Prestes a terminar a pós-graduação, no entanto, logo voltaria ao Brasil. O amor foi construído à distância.
— Nosso namoro durou um ano, 136 cartas, nove livros, dois telegramas e um telefonema — contou Sylvio, para suspiro coletivo da plateia, e espanto das filhas, que não conheciam todos aqueles números. — Naquele tempo, dar um telefonema era uma fortuna. Esta dedicatória escrevi no dia do meu aniversário, já doido por ela. Eu nem sei como perdi o livro, acho que foi numa mudança nos anos 80.
Um ano depois, Febea veio morar no Brasil, e Sylvio montou um apartamento no Méier para ela. Tiveram duas filhas, Isabella e Gabriella — que a essa altura se debulhavam em lágrimas na livraria —, e viveram felizes para sempre. Até que um câncer levou Febea aos 41 anos de idade. Sylvio nunca mais se casou.
— A arte de viver é a arte de acreditar em milagres, disse o poeta italiano Cesare Pavese, e se hoje eu estou aqui é porque ele está certo. Febea foi a pessoa que eu amei mais profundamente em toda a minha vida. E ela está presente aqui, nessas cinco pessoas que fizemos, nossas duas filhas e três netos. Esse é o milagre — declarou Sylvio, lembrando, ao final, uma frase que ouvira do neto quando ele tinha 4 anos, e que levava como mantra de vida: “Vovô, nada é grave.”
Na rotina dos livreiros de sebos, dedicatórias anônimas aparecem com muita frequência. Mais até do que os exemplares usados de “O Xangô de Baker Street”, de Jô Soares, um campeão nacional em rotatividade. Os livros já chegam com cantadas, desculpas, felicitações, despedidas, malfazejos.
— O livro usado traz uma história que muitas vezes é mais interessante do que aquela que ele conta. Aqui na Baratos nós tínhamos uma caixinha para guardar os objetos encontrados dentro das páginas, como cheques, receitas médicas, ingressos de cinema, flores, contas, fotos... Daria uma exposição — comenta Maurício, que também guardou por algum tempo dois livros trocados entre amigos, com dedicatórias irônicas em que tentavam dissuadir o outro das suas convicções políticas (um era de direita; o outro, um anarquista convicto).
Mas acabou vendendo os exemplares. É da natureza da profissão: o livreiro não é um colecionador, mas um comerciante.
— Todo sebo começa do mesmo jeito, quando a pessoa precisa vender os próprios livros. Esta é a diferença de um livreiro para um colecionador. Só o livreiro tem coragem de se desapegar. Ele sabe que os livros que são de verdade voltam. Já encontrei livro que tinha sido meu em acervo que fui comprar. Todo lote sempre está cercado de histórias, seja uma morte, uma herança, uma mudança repentina de casa, de estilo de vida — explica Marcelo Lachter, que começou a vender livros usados há 14 anos e hoje é dono da Gracilianos do Ramo, um sebo virtual.
Mesmo defendendo o caráter comercial do ofício, Marcelo tem um “Nove racconti” para chamar de seu: há seis anos, guarda na gaveta um exemplar de “Recortes”, livro de ensaios de Antonio Candido publicado em 1993, na esperança de devolvê-lo à família do antigo dono. A história teve início em 2006, quando Marcelo recebeu o telefonema de uma moradora da Barra da Tijuca, interessada em se desfazer da biblioteca do marido, morto meses antes. Como era uma coleção especializada em Humanas, área com muita procura, Marcelo arrematou o lote todo. Antes de fechar negócio, no entanto, a viúva fez um pedido: caso ele encontrasse ali perdido um exemplar com uma dedicatória do ex-ministro da Fazenda Pedro Malan ao marido, que devolvesse o título. Ambos tinham sido amigos de infância, perderam o contato e retomaram pouco antes de Malan tornar-se o braço forte de Fernando Henrique Cardoso.
Marcelo encontrou o livro e a dedicatória: “Meu melhor, apesar de distante, amigo. Espero que você goste deste ‘Recortes’, deste gênio literário e excepcional figura humana que é Antonio Candido. Precisamos ler coisas como estas para que não esqueçamos nunca de que há muito mais coisas na vida e no mundo que o nosso trabalho e nossas pequenas procupações cotidianas. Feliz aniversário, um abraço deste amigo e saudoso, Pedro Malan.” Mas perdeu a viúva de vista.
Outra história que aguarda um desfecho parecido é a de Nice Motta, de 46 anos, livreira há dez. Assim como Marcelo, Nice desistiu de uma loja física para se dedicar às vendas pela internet, suporte que salvou da falência milhares de livreiros no país, através do sucesso de sites como o Estante Virtual. Dona da Bola de Gude Livros, um acervo que ocupa 98% do seu apartamento na Vila da Penha, Nice é ainda mais romântica do que os colegas livreiros: ela embarga a voz cada vez que se depara com um fragmento de história perdida nos livros que compra e vende. É mais metódica também. Os objetos encontrados nos livros são reunidos numa caixa que ela guarda como um pequeno museu alheio.
Em meio aos objetos, há fotos, desenhos infantis, ingressos de espetáculos e até um passaporte para o Museu do Holocausto, na Alemanha. Há uma carta bem alegre: “Esta porra foi concebida pelo maior amigo putinho, mas com carinho. Uma beijunda e um abraçaralho deste que te escreve, com muito amor, 27/10/86, Edinho”); e uma muito triste (“À amiga Katia: cursei faculdade e não terminei, namorei cinco anos e não me casei, escrevi um livro e não publiquei. Minha vida segue em frente, sempre pela metade. Wagner, 73.”
Mas a pepita é um livro encontrado por ela em 2007: “O poder do jovem”, best-seller de autoajuda do parapsicólogo Lauro Trevisan. O exemplar tem duas dedicatórias. Uma escrita nas costas da primeira página: “Bruno, eu vi este livro e achei que você ia gostar. É coisa de mãe, fica tentando adivinhar o gosto do filho, eu queria te dar o mundo, mas é melhor você descobrir com a ajuda deste livro o seu mundo inteiro. Estou sempre aqui, filho, conte comigo, sua mãe, beijos, te amo, te amo e te amo, Rio, 15/03/02.”
Seria só uma mensagem emocionada, não houvesse a segunda, na página seguinte: “Rafael, este livro foi o último presente que eu dei para o Bruno, ele não chegou a ler. Como eu sei que ele te adorava, gostaria de dar a você, leia por ele e por você, com carinho, Clara, 15/03/06.”
— É muito emocionante pensar no amor desta mãe, que o filho morreu, e que ela teve o carinho de dividir o amor com o amigo do filho. Eu sou mãe, e sei como é inconcebível pensar na perda de um filho. Se ao menos eu pudesse repará-la em relação à perda do livro... — diz Nice, sonhando com um acaso que a coloque no caminho daquela mãe. — Trabalhar com livros é apaixonante. O livro não é só a história que o autor conta, mas a história que o antigo dono também conta.
No início deste ano, Nice encontrou outro volume de “O poder do jovem”, que ela ainda está pensando se vai para a caixinha ou não. A mensagem na folha de rosto diz o seguinte: “Para o meu querido neto Fábio conservar à sua cabeceira, e enfrentar a caminhada da vida sempre forte! E vencedor! 05/88, vovó Abigail Araújo.” Por enquanto, vai ficar lá.