Do coração e outros corações

Do coração e outros corações

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

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"O homem de hoje não digere o que não pode ser abreviado" - (Walter Benjamin 

citando o poeta Paul Valery para contextualizar ao que a lógica capitalista pós moderna 

conduz o sujeito).

do facebook de Mariana Festucci

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Oinc...

Do Blog do Rigon, na Má-ringa
ELEIÇÕES 2012

Por aqui, tudo pode

Em Maringá, uma candidata a vereadora está convidando merendeiras e auxiliares de creche apra um almoço no próximo domingo, na Associação dos Funcionários Municipais. É mais uma das muitas denúncias que circulam pela cidade, que cobra uma ação do Comitê 9840. Há quem defenda que além da candidata deve ser denunciada a diretoria da entidade de servidores, que oficialmente é quem estaria bancando a festa da troca de votos por comida. Circula ainda que na Secretaria de Educação é uma ocupante de cargo comissionado que organiza os jantares com as diretoras de creches e escolas, que teriam sido obrigadas a comprar uma camiseta da candidata por R$ 20,00 para usar nas panfletagens na porta desses estabelecimentos.
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Meu comentário:
E depois falamos que só os políticos dão exemplo de corrupção! Quanta subserviência!

terça-feira, 25 de setembro de 2012

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Assim devera eu ser

do Blog de Joana Lopes


Minuciosa formiga
não tem que se lhe diga:
leva a sua palhinha
asinha, asinha.
Assim devera eu ser
e não esta cigarra
que se põe a cantar
e me deita a perder.
Assim devera eu ser:
de patinhas no chão,
formiguinha ao trabalho
e ao tostão.
Assim devera eu ser
se não fora não querer.

 Alexandre O'Neill

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

A mão ou o pé das agências ....


As agências subordinadoras da universidade

Prof. Dr. José Maria Alves da Silva
Universidade Federal de Viçosa, MG
O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal Docente (Capes) são órgãos estatais que foram criados com objetivo de fomentar a ciência e a educação no Brasil.
Um dos idealizadores do Conselho Nacional de Pesquisa, fundado em 1951, do qual se originou o CNPq, foi o grande físico Cesar Lattes, que ficou mais conhecido pelo currículo que lhe leva o nome, e só não esteve entre os laureados ao premio Nobel porque os que costumam conceder essa honraria, em caso de dúvida, pendem para o lado dos compatriotas.
A Capes, idealizada pelo educador Anísio Teixeira, tinha por objetivo original a qualificação de professores, partindo do princípio óbvio de que não pode haver boa educação sem bons quadros docentes, e que, portanto, não adianta expandir o sistema educacional sem o recurso fundamental que determina sua qualidade: o professor. Esta era a lógica simples na qual se fundamentava o ideal de Anísio Teixeira. Ele tinha visão de futuro e sabia ser necessário para o Brasil adaptar seu sistema educacional para uma nova era de modernização econômica, que inevitavelmente viria de fora para dentro, e que, para acompanhar a tendência mundial, o Brasil precisaria de professores capazes de assimilar e transmitir os novos conhecimentos que se tornavam necessários. Portanto, era preciso fazer um trabalho de formação de quadros docentes adaptados às exigências de uma nova época. Era esse, em linhas gerais, o motivo original da criação da Capes.
Além do apreço à boa educação e à boa ciência, os idealizadores do CNPq e da Capes eram patriotas que achavam que o Brasil poderia percorrer o caminho já trilhado pelos países desenvolvidos. Não há dúvida de que, para isso, o desenvolvimento da educação, da ciência, e, por meio delas, da tecnologia, eram os ingredientes mais essenciais. No entanto, fazendo uma avaliação do comportamento dessas agências, nas últimas décadas, chegamos à conclusão que elas estão em flagrante contradição com os objetivos originais. Não estão honrando a memória dos grandes brasileiros que mais contribuíram para sua criação.
Certamente, as universidades públicas brasileiras poderiam contar com apoios importantes caso elas, de fato, funcionassem de acordo com os objetivos propostos originariamente, mas sem que, para isso, tivessem de se portar de forma subordinada e dependente, caso contrário, além da violação do princípio da autonomia, se estaria implantando instrumentos de controle governamental sobre o meio acadêmico, em clara violação a princípios consagrados do Estado Democrático de Direito e absoluto desacordo com a idéia de universidade como espaço da liberdade de pensamento, da liberdade de cátedra, da liberdade de expressão e do pluralismo de idéias. Mas, infelizmente, é isso que está acontecendo pari passu com a crescente relação de dependência financeira para com órgãos federais localizados em Brasília.
A partir do governo FHC essa relação de dependência acentuou-se, devido ao esvaziamento de recursos orçamentários destinados diretamente a elas, a ponto de implicar numa velada relação de subordinação. O CNPq passou a ditar os rumos da pesquisa e a Capes a ter poder de vida e morte sobre cursos de pós-graduação. 

Antes disso, já se havia criado uma aberração por meio do CNPq: a bolsa de produtividade em pesquisa, crasso exemplo de intromissão indevida no meio acadêmico. Sei que falando isso vou, desde já, angariar as antipatias de um número grande de docentes que já se acostumaram a contar com essa forma de renda complementar. Mas é preciso dizer que isso está em contradição com o princípio da autonomia e a idéia de universidade como “consciência crítica da Nação”. Tal como está estabelecida, a bolsa de produtividade de pesquisa é uma distorção, porque, ao estabelecer uma vinculação direta do CNPq com cada docente pesquisador simplesmente “passa por cima das instituições”. 

Se fosse para premiar produtividades excepcionais em pesquisa, algo que, a meu ver é muito difícil de aferir à distância, melhor seria que determinadas quotas de bolsas fossem concedidas às universidades, segundo critérios muito bem definidos, para que estas fizessem a distribuição interna segundo seus próprios critérios e objetivos, os quais, naturalmente deveriam ser definidos mediante ampla discussão entre a comunidade interessada.
Essa “ligação direta” com os docentes, extremamente vulnerável a fisiologismos de toda natureza, abre a possibilidade de que uma burocracia brasiliense possa influenciar nos rumos da pesquisa nos campus universitários espalhados pelo país, e assegurar a certas oligarquias científicas bem estabelecidas acesso privilegiado a recursos públicos significativos. Outros canais de influência são as destinações indiretas de verbas extraordinárias de convênios que dirigentes universitários se acostumaram a disputar, “de pires na mão”, e que também são extremamente susceptíveis ao tráfico de influências.
Tal situação é especialmente lamentável a todos os que vieram para a universidade pública imaginando fazer parte de uma instituição fundamental do Estado e não mais um órgão qualquer de governo, sujeito aos “humores” da política.

É comum ver docentes da universidade pública, contratados em regime de dedicação exclusiva, que se apresentam ao mesmo tempo como “professor universitário” e “pesquisador do CNPq”. 

Isso mostra que falta definir ainda se a dedicação exclusiva é para ser entendida no aspecto institucional ou funcional. A valer o primeiro caso, ninguém da universidade pública, com DE, poderá ser chamado de pesquisador do CNPq, posto que, tal regime necessariamente pressupõe o envolvimento, na universidade, com a tríade: ensino, pesquisa e extensão, indissociavelmente, sem qualquer vínculo com outra instituição. Se for entendida no aspecto funcional, isto é, como dedicação exclusiva à atividade acadêmica, o vínculo docente com instituições não-universitárias poderia ser permitido, mas isso inevitavelmente introduziria algum desequilíbrio na tríade. É isso que acontece com os bolsistas do CNPq, para os quais o lado da pesquisa acaba ganhando mais peso, em detrimento do ensino e da extensão. A pesquisa é incentivada, pelas bolsas de produtividade em pesquisa, mas ninguém incentiva a educação superior, como atividade formadora de opiniões políticas esclarecidas e de profissionais de alto conteúdo ético, que estão muito em falta neste País.

Se existe um órgão lotado no Ministério da Ciência e Tecnologia, para fomentar atividades que lhe dizem respeito, é lógico supor que o mesmo deveria acontecer no MEC, se for para fomentar a educação. Mas, na verdade, isso não ocorre. Um exame da missão da Capes, disponível em seu sítio da internet, indica maior compromisso com pesquisa científica do que com a educação superior propriamente dita. Há bom tempo que sua principal função tem sido fomentar e avaliar cursos de pós-graduação, atividades para as quais foram destinados cerca de 75% dos recursos orçamentários executados pelo órgão em 2009 (cerca de um bilhão e setecentos milhões de reais). Até aí nenhuma incoerência, uma vez que os cursos de pós-graduação também fazem parte da função educação. Contudo, os parâmetros de avaliação e critérios de distribuição de recursos utilizados priorizam as atividades de pesquisa vinculadas aos programas de pós-graduação, como é o caso de publicações em revistas científicas indexadas, fator preponderante na pontuação aos programas. Outro fator importante é o que se chama de inserção internacional, entenda-se “convergência de conteúdos disciplinares e programas de pesquisa a padrões ditados de fora para dentro”. Podemos chamar a isso de fomento à educação superior nacional?
Na verdade, esses critérios estão contribuindo para aumentar as desigualdades de condições entre instituições públicas brasileiras de ensino superior. As instituições que não operam com pós-graduação ficam limitadas às dotações orçamentárias do OGU diretamente alocadas à função educação superior. As que possuem programas de pós-graduação, tradicionalmente as melhor localizadas em relação aos centros de poder, têm acesso diferenciado a recursos extras provenientes de transferências da Capes e do CNPq. Assim, nosso sistema de ensino superior pode ser dividido em dois segmentos: um que subsiste em condições miseráveis, mas independente das agências reguladoras, e outro constituído pelas universidades com tradição em pesquisa, mas que depende crucialmente dessas fontes de recursos, razão pela qual a Capes adquiriu um poder de vida e morte sobre as instituições que dele participam. A criação de novos programas de pós-graduação, com uma mínima garantia de recursos, depende de sua aprovação, em conformidade com os padrões ditados, ao passo que os programas já existentes que não obtiverem pontuação suficiente para alcançar classificação igual ou superior a quatro perdem acesso aos recursos e são praticamente condenados à extinção. Nessa relação subordinada, tudo o que os docentes podem fazer é seguir os ditames da Capes, que os coordenadores colocam na mesa de reuniões, e ponto final.
Estando, de fato, mais focada na atividade de pesquisa do que na educação, a Capes se coloca numa área de superposição com o CNPq, desvirtuando-se em relação aos seus objetivos originais, que era o da formação de quadros docentes qualificados

Na universidade pública, isso pressupõe a formação não apenas de pesquisadores ou tecnólogos, mas, sobretudo, de docentes politizados e pensadores das problemáticas nacionais, capazes de contribuir para a formação de agentes de transformação social. No entanto, por força das ingerências dessas agências, introduziu-se um viés cientificista-tecnológico a ponto de fazer com que as atividades nas áreas de humanidades sejam regidas pelos mesmos parâmetros das ciências naturais, exatas e tecnológicas. Trata-se de uma imposição autoritária do monismo metodológico pelas oligarquias científicas que determinam critérios que são mais convenientes a eles próprios, à revelia do povo e do País. Essa é a razão pela qual se vê hoje tantos cientistas políticos, sociólogos, filósofos, historiadores, economistas, geógrafos, antropólogos e outros profissionais das humanidades completamente alheios à nefasta tendência social brasileira. O que estão fazendo eles? Estão elaborando projetos de pesquisa para o CNPq, preenchendo relatórios de prestação de contas, atualizando ininterruptamente o currículo Lattes, prospectando editais e correndo atrás da publicação de papers em revistas indexadas, como parte do esforço para que os programas de pós-graduação aos quais pertencem alcancem os pontos necessários para continuar existindo.

É paradoxal constatar que a Capes esteja, de fato, contribuindo para a alienação da classe que deveria estar pensando criticamente o País. O clima de alienação no meio acadêmico é visível na falta de debates, na ausência de conferências indignadas, e mesmo de panfletagem nos meios de comunicação de massa, como era comum em outros tempos de luta pelas liberdades democráticas. Tanto barulho por nada. Os painéis temáticos dos congressos nas áreas de humanidades no Brasil hoje são de uma pobreza assustadora. O que mais se vê são discussões de métodos e assuntos especializados de baixa relevância, por grupos restritos de especialistas que só se comunicam entre si. Enquanto isso, o Brasil caminha na direção contrária do desenvolvimento, com um povo majoritariamente carente de habitação, educação, cuidados pessoais, sendo tratado como gado nos meios de transporte coletivo e no SUS; com uma classe média cada vez mais ameaçada pelo avanço do consumo de drogas, e da morte violenta pelo crime e acidentes de trânsito, devidos à precariedade e a incúria de órgãos estatais que deveriam zelar pela segurança das famílias.

Na origem de tudo isso está um Estado que se esfacela moralmente a olhos vistos, enquanto os “cientistas sociais” permanecem num silêncio de sarcófago. Se vivos estivessem, o que diriam Cesar Lattes, Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro, entre outros patriotas que sonharam com um Brasil grande?

domingo, 23 de setembro de 2012


do Blog da CATATAU aqui
Transformar o mundo numa laje

http://i292.photobucket.com/albums/mm7/catatando/538687_427702477276184_1930413042_n.jpgDiversos Quero-quero se abrigam como podem em Araguaina, TO
Algum estudioso bem poderia dar conta da questão: de onde vem a preferência do brasileiro pela laje, a ponto de lajear seu universo inteiro, remediando tudo depois com o ar condicionado?
É incrível notarmos a multiplicação de ilhas de calor onde, muitos anos atrás, saudosistas exaltavam valores como o frescor tropical, a exuberância da vida e outras coisas mais. Em lugares como o Rio de Janeiro e São Paulo, a temperatura pode variar 10º apenas devido ao padrão de concreto!
E dá-lhe ar condicionado.
É curioso ver o padrão repetido em muitos lugares no Brasil, bastando viajar um pouco: plantações sem fim, inúmeras desmatações, cedem lugar às vezes a pequenas ilhas de concreto e asfalto – diga-se “cidades” -, com ruas estreitas e baixas, calçadas minúsculas, muros altos e outros concretos à escolha. Sem exigências urbanísticas maiores (da prefeitura ou qualquer lugar), as construções desordenadas encontram seu próprio padrão: asfalto e concreto.
Tudo se passa como se a relação do brasileiro com seu mundo imediato, aquele que toca os sentidos, fosse inteiramente falseada. Como se nossa imaginação nos conduzisse a um mundo que não é bem esse, de asfalto e laje, enquanto produzimos todo dia mais asfalto e mais laje.
Ao redor o ônibus cheio, o calor insuportável, o trânsito ruim, o sol ruim na cara, a calçada estreita e a sala lacrada com o ar condicionado. Nisso tudo, para onde vão as cabeças?
Novamente: não seria inútil perguntar de onde vem esse hábito do brasileiro lajear seu mundo. Um mundo tropical, sempre valorizado pela exuberância, tornando-se pouco a pouco um lugar difícil até para a sombra dos pássaros.
Alguma pressa oculta para a laje derradeira? :)
http://i292.photobucket.com/albums/mm7/catatando/578618_153958754744385_1335571393_n.jpg

Vamos...

Do Orlando Pedroso aqui

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Poizé!

do Blog do SOLDA aqui

Em Portugal



22.9.12

A grande conspiração

do Blog de Joana Lopes, Portugal

Recomendo a leitura da crónica semanal de Miguel Sousa Tavares (sem link), com o título deste post, no primeiro caderno do Expresso de hoje. Sei que me repito, mas não me importo: já não são apenas os perigosos esquerdistas que alertam para o projecto ideológico subjacente aos «ajustamentos» de que estamos a ser objecto e vítimas e que o caracterizam mais ou menos explicitamente. 

Alguns excertos do texto, que me parecem «cristalinos»: 

«Há quase um ano que o venho escrevendo aqui: o programa económico deste Governo não se limita a tentar endireitar as contas públicas à custa de sacrifícios cuja insensibilidade e ineficácia são de bradar aos céus. Há também uma agenda escondida, que envolve uma vingança sobre a história, uma desforra de classe, quase uma alteração dos valores cívicos em que a Europa se funda. (...) 

O objectivo de Passos Coelho e do seu quinteto de terroristas económicos (Gaspar, Moedas, António Borges, Braga de Macedo e Ferraz da Costa) é outro bem diferente: eles querem mudar o paradigma económico, mesmo que para tal tenham de destruir o país, como, aliás, estão a fazer. Fiel aos ensinamentos dos seus profetas americanos, esta extrema-direita económica que nos caiu em cima acredita que o Estado deve deixar de gastar recursos com quem não garante retorno e concentrar-se apenas em apoiar, ajudar, estimular e dar livre freio aos poucos negócios escolhidos — que, assim, não poderão deixar de prosperar. (...) 

Isto tornou-se claro com a história da TSU. Acreditar que uma medida tão irracional, fundada em estudos que nem se atrevem a mostrar e desacreditada por todos, capaz de pôr o país na rua e ameaçar o tão louvado consenso social e político, terá sido tomada por mera incompetência e precipitação é tomá-los por estúpidos. O que se pretendia não era aliviar a tesouraria das empresas ou potenciar as exportações. O que se pretendia, como ficou evidente na entrevista do PM à RTP, era garantir uma “vantagem” permanente: a baixa de salários. Porque esse é um dos objectivos centrais desta cruzada: desvalorizar por todas as formas, incluindo por via fiscal, o valor do trabalho. O princípio é simples e, se atentarem bem, tudo segue uma ordem pré-estabelecida: primeiro, rever a legislação laboral, para tornar os despedimentos fáceis e baratos; por essa via, criar um batalhão de desempregados que pressionem o mercado de trabalho, fazendo baixar os custos salariais; assim, potenciar os lucros de algumas empresas de mão-de-obra intensiva; e, assim, garantir o sucesso do “ajustamento” da nossa economia, “so help them God”.

Lembrem-se do Hamlet: "a loucura dos poderosos não pode passar sem vigilância".»

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Bem-vindos ...


Do Blog da Editora BoiTempo

Bem-vindo ao “reino animal espiritual”: Artigo de Slavoj Žižek sobre o vácuo moral do capitalismo global

Por Slavoj Žižek.
Confira abaixo artigo inédito, traduzido por Rogério Bettoni, enviado com exclusividade pelo autor para a Boitempo publicar em seu Blog.
For the english version, click here.
O documentário The Act of Killing [O ato de matar, Final Cut Film Production, Copenhagen] estreou em 2012 no Festival de Cinema de Telluride e foi exibido no Festival Internacional de Cinema de Toronto. Dirigido por Joshua Oppenheimer, o filme nos mostra uma visão única e profundamente perturbadora do impasse ético do capitalismo global.
O filme – rodado em Medan, Indonésia, em 2007 – relata um caso de obscenidade levado ao extremo: um filme realizado por Anwar Congo e seus amigos, que hoje são políticos respeitados, mas já foram gângsteres e líderes de esquadrão da morte, tendo desempenhado um papel importante no assassinato de cerca de 2,5 milhões de supostos simpatizantes comunistas em 1966, principalmente chineses étnicos. The Act of Killing trata de “assassinos que venceram e do tipo de sociedade que construíram”. Depois de vencerem, seus atos terríveis não foram relegados à condição de “segredo sujo”, o crime fundador cujos traços devem ser obliterados – ao contrário, eles se vangloriam abertamente dos detalhes dos massacres (o jeito de estrangular vítimas com um fio, o jeito de cortar a garganta, como violentar uma mulher da maneira mais prazerosa…). Em outubro de 2007, a televisão estatal da Indonésia produziu um programa de entrevistas celebrando Anwar e seus amigos; no meio do programa, depois que Anwar diz que os assassinatos foram inspirados em filmes de gângsteres, a sorridente apresentadora vira-se para a câmera e diz: “Incrível! Uma salva de palmas para Anwar Congo!”. Quando ela pergunta se Anwar tem medo da vingança dos parentes das vítimas, ele responde: “Eles não podem se vingar. Quando levantam a cabeça, nós cortamos elas fora”. Um de seus escudeiros acrescenta: “Vamos exterminar todos eles”, e o público explode em uma exuberante aclamação… é preciso ver para acreditar que isso é possível. Mas o que também torna The Act of Killing extraordinário é o nível de reflexividade entre documentário e ficção – de certo modo, o filme é um documentário sobre os efeitos reais de se viver em uma ficção:
Para explorar a arrogância estarrecedora dos assassinos, e para testar o limite de seu orgulho, nós começamos com retratos documentais e simples reconstituições dos massacres. Mas quando percebemos que tipo de filme que Anwar e seus amigos realmente queriam fazer sobre o genocídio, as reconstituições ficaram mais elaboradas. Até que oferecemos a eles a oportunidade de dramatizar os assassinatos usando os gêneros cinematográficos que quisessem (western, gângster, musical). Ou seja, nós demos a eles a chance de roteirizar, dirigir e estrelar as cenas que eles tinham em mente enquanto matavam as pessoas.” [1]
Eles atingiram o limite do “orgulho” dos assassinos? Eles mal chegaram a encostar em Anwar quando propuseram que ele representasse, em uma reconstituição, a vítima de suas torturas; quando um arame é colocado em volta do seu pescoço, ele interrompe a atuação e diz “Perdoem-me pelo que fiz”. Mas isso é mais um relapso temporário que não levou a nenhuma crise mais profunda de consciência – seu orgulho heroico assume de novo o controle no mesmo instante. Talvez a tela protetora que impediu uma crise moral mais profunda fosse a mesma tela cinematográfica: como na tortura e nos assassinatos reais do passado, eles experimentaram sua atividade como uma encenação de seus modelos cinematográficos, o que possibilitou que experimentassem a própria realidade como ficção – na condição de grandes admiradores de Hollywood (eles começaram a carreira como organizadores e controladores do mercado negro de ingressos de cinema), eles já representavam um papel nos seus massacres, imitando um gângster, um cowboy ou até mesmo um bailarino de Hollywood.
Aqui entra o “grande Outro”, não só pelo fato de os criminosos terem cometido seus assassinatos nos moldes do imaginário cinematográfico, mas também principalmente, e de modo muito mais importante, por conta do vazio moral da sociedade: de que tipo de tessitura simbólica (conjunto de regras que traçam a linha entre o que é e o que não é publicamente aceitável) uma sociedade deve ser composta se até mesmo um nível mínimo de vergonha pública (o que obrigaria os criminosos a tratar seus atos como um “segredo sujo”) é suspenso, e a orgia monstruosa da tortura e da matança pode ser celebrada publicamente mesmo décadas depois de ter acontecido, não só como crime necessário e extraordinário pelo bem público, mas como atividade comum, prazerosa, aceitável? Obviamente, devemos evitar aqui a fácil armadilha de colocar a culpa diretamente em Hollywood ou no “primitivismo ético” da Indonésia. Antes, o ponto de partida deveria ser os efeitos deslocadores da globalização capitalista que, ao solapar a “eficácia simbólica” das estruturas éticas tradicionais, cria esse vazio moral.
No entanto, a condição do “grande Outro” merece aqui uma análise mais cuidadosa – comparemos The Act of Killing a um incidente que chamou muito a atenção nos Estados Unidos há algumas décadas: uma mulher apanhou e foi lentamente assassinada por um criminoso violento no pátio de um grande prédio residencial no bairro do Brooklyn, em Nova York. Das mais de setenta testemunhas que viram claramente pela janela o acontecido, nenhuma chamou a polícia – mas por quê? Conforme estabeleceu a investigação posterior, a desculpa predominante, sem dúvida, foi que cada testemunha pensou que alguém já tinha chamado ou chamaria a polícia. Esses dados não devem ser descartados em termos morais como uma mera desculpa para a covardia moral e a indiferença egoísta: o que encontramos aqui também é a função do grande Outro – dessa vez não como o “sujeito suposto saber” de Lacan, mas como o que poderíamos chamar de “sujeito suposto chamar a polícia”. O erro fatal das testemunhas do lento assassinato do Brooklyn foi confundir a função simbólica (ficcional) do “sujeito suposto chamar a polícia” como uma afirmação empírica da existência, concluindo erroneamente que deveria haver pelo menos uma pessoa que efetivamente chamaria a polícia – elas sobrepujaram o fato de que a função do “sujeito suposto chamar a polícia” é operativa mesmo que não haja nenhum sujeito para exercê-la. [2]
Isso significa que, pela gradual dissolução da nossa substância ética, estamos simplesmente regredindo ao egoísmo individualista? As coisas são muito mais complexas. Muitas vezes ouvimos que a crise ecológica é resultado do nosso egoísmo de curto prazo: obcecados por riqueza e prazeres imediatos, nós nos esquecemos do Bem comum. No entanto, é aqui que se torna fundamental a ideia de Walter Benjamin sobre o capitalismo como religião: o verdadeiro capitalista não é um egoísta hedonista; ao contrário, ele é um devoto fanático da tarefa de multiplicar sua riqueza, pronto para desprezar a própria saúde e felicidade, sem falar da prosperidade da própria família e do bem estar do ambiente, para chegar a esse objetivo. Portanto, não há necessidade nenhuma de evocar a superioridade moral e detonar o egoísmo capitalista – contra a dedicação capitalista, fanática e pervertida, basta evocar uma boa dose de simples preocupações egoístas e utilitaristas. Em outras palavras, a busca do que Rousseau chama de amour-de-soi natural requer um nível altamente civilizado de consciência. Ou, colocando nos termos de Alain Badiou: ao contrário do que ele sugere, a subjetividade do capitalismo não é a subjetividade do “animal humano”, mas sim um chamado para subordinar o egoísmo à autorreprodução do Capital. Contudo, isso não é sugerir que Badiou esteja errado: o indivíduo preso no capitalismo global de mercado necessariamente percebe-se como um “animal humano” hedonista, interessado em si mesmo, e essa percepção de si é uma ilusão necessária.
Em outras palavras, o egoísmo do interesse próprio não é o fato brutal das nossas sociedades, mas sim sua ideologia – a ideologia articulada filosoficamente na Fenomenologia do espírito, de Hegel, quase no final do capítulo sobre a Razão, sob o nome de “das geistige Tierreich” – o “reino animal espiritual”, nome que Hegel dá à sociedade civil moderna na qual os animais humanos estão presos em uma interação egoísta. Como afirma Hegel, o avanço da modernidade foi permitir que “o espírito da subjetividade chegue à realização da extrema autonomia da particularidade pessoal”. [3] O reino desse princípio torna possível a sociedade civil como domínio em que os indivíduos humanos autônomos se associam uns com os outros para satisfazer suas necessidades pessoais: todos os fins comuns são subordinados aos interesses privados dos indivíduos, são conscientemente postos e calculados com a meta de maximizar a satisfação desses interesses. Aqui, o que importa para Hegel é a oposição entre privado e comum percebida por aqueles em quem Hegel se apoia (Mandeville, Smith), bem como por Marx: os indivíduos percebem o domínio comum como algo que deveria servir a seus interesses privados (como um liberal que pensa o Estado como protetor da liberdade e segurança privadas), porém, ao perseguirem seus objetivos limitados, eles servem efetivamente ao interesse comum. A tensão propriamente dialética surge aqui quando tomamos ciência de que quanto mais os indivíduos agem de modo egoísta, mais contribuem para a riqueza comum. O paradoxo é que quando os indivíduos querem sacrificar seus interesses privados limitados e trabalhar diretamente para o bem comum, quem sofre é o próprio bem comum – Hegel adora contar anedotas históricas sobre um príncipe ou rei bom cuja dedicação ao bem comum levou seu país à ruína. A novidade propriamente filosófica de Hegel foi ainda determinar essa “contradição” ao longo das linhas de tensão entre o “animal” e o “espiritual”: a substância espiritual universal, “obra de todos e de cada um”, surge como resultado da interação “mecânica” entre os indivíduos. Isso significa que a mesma “animalidade” do “animal humano” egoísta (o indivíduo que participa da rede complexa da sociedade civil) é resultado do longo processo histórico da transformação da sociedade hierárquica medieval na sociedade burguesa moderna. Desse modo, é a própria satisfação do princípio de subjetividade – o oposto radical de animalidade – que dá origem à reversão da subjetividade em animalidade.
Os traços dessa passagem podem hoje ser detectados em todos os lugares, especialmente nos países asiáticos de desenvolvimento acelerado onde o capitalismo exerce impacto mais brutal. A exceção e a regra, de Bertolt Brecht (peça didática escrita em 1929-30) conta a história de um rico comerciante que, com seu cule (carregador) cruza o deserto de Jahí (mais um dos lugares chineses fictícios de Brecht) para fechar um negócio de petróleo. Quando os dois se perdem no deserto e a água começa a acabar, o comerciante atira equivocadamente no cule, achando que estava sendo atacado, quando na verdade o cule estava lhe oferecendo água que ainda tinha na garrafa. Posteriormente, na corte, o comerciante é absolvido: o júri conclui que ele tinha todo o direito de temer uma ameaça potencial do cule, portanto ele estava justificado em atirar no cule como legítima defesa independentemente de haver ou não uma ameaça efetiva. Como o comerciante e o cule pertenciam a classes diferentes, o comerciante tinha todas as razões para esperar o ódio e a agressão – essa é a situação típica, a regra, enquanto a bondade do cule era a exceção. Não seria essa história mais uma simplificação marxista ridícula de Brecht? Não, a julgar pelo que nos mostra um relato verdadeiro e atual da China:
“Em Nanquim, há meia década, uma idosa caiu enquanto subia em um ônibus. Os jornais contam que a senhora de 65 anos quebrou a bacia. No local, um jovem foi ajudá-la; vamos chamá-lo de Peng Yu, pois este é seu nome. Peng Yu deu 200  ¥ para a senhora (na época, o suficiente para comprar trezentas passagens de ônibus) e a levou ao hospital. E continuou com ela até a chegada da família. A família moveu uma ação contra o jovem, pedindo 136,419  ¥. O tribunal do distrito de Gulou, Nanquim, efetivamente considerou o jovem culpado e ordenou que ele pagasse 45,876  ¥. O tribunal concluiu que, ‘segundo o senso comum’, como Peng Yu foi o primeiro a sair do ônibus, era praticamente certo que ele tivesse derrubado a senhora. Além disso, ele na verdade admitiu a culpa, segundo o tribunal, ao ficar com a senhora no hospital. Sendo assim, uma pessoa normal não seria tão gentil quanto Peng Yu afirmava ser.” [4]
Esse incidente não seria um paralelo exato à história de Brecht? Peng Yu ajudou a senhora por simples compaixão ou decência, mas como essa demonstração de bondade não é “típica”, não é a regra (“uma pessoa normal não seria tão gentil quanto Peng Yu afirmava ser”), ela foi interpretada pela corte como prova da culpa de Peng Yu, e ele foi punido de acordo. Não seria essa uma ridícula exceção? Nem tanto, de acordo com o People’s Diary (jornal do governo) que, em uma pesquisa de opinião realizada online, perguntou a um grande grupo de jovens o que eles fariam se vissem uma pessoa mais velha caída no chão: “87% dos jovens não ajudaria. A história de Peng Yu reflete a vigilância do espaço público. As pessoas só ajudam quando há uma câmera presente”. Essa relutância em ajudar sinaliza uma mudança na condição do espaço público: “a rua é um lugar intensamente privado, e aparentemente as palavras público e privado não fazem sentido nenhum”. Em suma, estar em um espaço público não implica apenas estar junto de pessoas desconhecidas – ao me mover entre elas, eu ainda estou dentro do meu espaço privado, não estou envolvido em nenhuma interação com elas, tampouco as reconheço. Para que seja considerado público, o espaço da minha coexistência e interação com os outros (ou com a falta deles) tem de ser coberto por câmeras de segurança.
Outro sinal dessa mesma mudança pode ser visto como a extremidade oposta de se observar as pessoas morrendo em público e não fazer nada – a recente tendência do sexo em público no ramo do pornô hard-core. Cada vez mais surgem filmes que mostram um casal (ou mais pessoas) envolvidos em jogos eróticos até chegar à cópula propriamente dita em algum espaço público bastante movimentado (em uma praia pública, dentro de um bonde ou trem, em um ônibus ou estação de metrô, na área aberta de um shopping center…), e o interessante é que a grande maioria das pessoas que passam ignora a cena (ou finge ignorá-la) – uma minoria olha discretamente para o casal, e menos pessoas ainda fazem uma observação obscena sarcástica. Mais uma vez, é como se o casal fazendo sexo continuasse no seu espaço privado, de modo que não devemos nos preocupar com sua intimidade.
Isso nos leva de volta ao “reino animal espiritual” – ou seja, quem de fato se comporta assim, ignorando moribundos na bendita ignorância ou transando na frente dos outros? Os animais, é claro. Esse fato de modo nenhum implica a conclusão ridícula de que estamos de alguma maneira “regredindo” ao nível do animal: a animalidade com a qual lidamos aqui – o egoísmo cruel de cada um dos indivíduos que busca seus próprios interesses – é o resultado paradoxal da rede mais complexa das relações sociais (troca comercial, mediação social de produção), e o fato de os próprios indivíduos estarem cegos para essa rede complexa aponta para o seu caráter ideal (“espiritual”): na sociedade civil estruturada pelo mercado, a abstração domina mais do que nunca na história da humanidade. Em contraste com a natureza, a competição do mercado de “lobos contra lobos” é, portanto, a realidade material do seu oposto, da substância pública “espiritual” que fornece a base e o pano de fundo para essa luta entre animais privados.
Costuma-se dizer que hoje, com a nossa exposição total à mídia, a cultura das confissões públicas e os instrumentos de controle digital, o espaço privado está desaparecendo. Devemos contrapor esse lugar-comum com a afirmação oposta: é o próprio espaço público que está desaparecendo. A pessoa que expõe na internet fotografias do próprio nu ou dados íntimos e sonhos obscenos não é exibicionista: os exibicionistas invadem os espaços públicos, ao passo que as pessoas que postam suas imagens de nu na internet continuam no seu espaço privado e estão apenas expandindo-o para acrescentar nele outras pessoas. E, voltando a The Act of Killing, o mesmo vale para Anwar e seus colegas: eles estão privatizando o espaço público em um sentido que é muito mais ameaçador do que a privatização econômica.

[1] Citado do material de publicidade distribuído pela Final Cut Film Production.
[2] Podemos até imaginar um teste empírico para essa afirmação: se pudéssemos recriar uma circunstância em que cada uma das testemunhas pensasse que observava sozinha essa cena grotesca, poderíamos prever que uma grande maioria delas teria chamado a polícia, apesar do cuidado oportunista de “não se envolver no que não é da sua conta”.
[3] G. W. F. Hegel, Elementos da Filosofia do Direito (Elements of the Philosophy of Right, Cambridge, Cambridge University Press, 1991, §260).
[4] Michael Yuen, “China and the Mist of Complicated Things” (texto cedido pelo autor).
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quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Cat, chat,,gato

Sorry. Não sei de quem é essa linda imagem.

Sim City

Sim City

do Blog A BARRIGA DE UM ARQUITETO AQUI
Uma cidade fantasma que parece extraída de um jogo de Sim City, em construção nos arredores de Luanda. Uma “paisagem” distante de conceitos convencionais de geografia urbana para o ciclo de vida das cidades, porque não é já de cidades que se trata. Estamos perante a materialização de uma lógica de investimento que já não carece de pessoas – a cidade que se auto-constrói como uma bolha dentro da sua própria bolha.

Uma curiosa forma de “desenvolvimento” que perdeu de vista qualquer noção de progresso. O que vemos aqui são modelos importados de realidades urbanas já de si esgotadas e falidas. Algures, num banco na Ásia distante, isto é um activo financeiro vendido em títulos e oscilando ao sabor das expectativas. A cidade é já um mero acessório do mercado financeiro. Uma simulação de economia. Sim City.

Com que cara....


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Veja-se! do Blog do SOLDA!

Resumo do filme XXY de Lucia Puenzo. O filme XXY da cineasta argentina Lúcia Puenzo traz como enredo a questão da sexualidade através da história de Alex, um(a) jovem intersexual (vulgarmente chamados de hermafroditas, ou seja, que apresentam os dois órgãos sexuais) e que se vê constantemente em conflito com a idéia de optar por um dos sexos e gêneros; caso ainda mais agravado pela presença de um cirurgião e sua família, convidados pela mãe da jovem com a ideia de uma possível cirurgia de redesignação sexual, e sua relação com o filho do casal que aflora ainda mais seus desejos e dúvidas quanto à idéia de escolher um “lado”. Alex entra em um embate consigo e com as relações estabelecidas que são influenciadas pela sua situação, o dilema da sexualidade como identidade e o próprio preconceito por parte dos outros.
Mas o dilema de Alex traz o confronto daquilo que é frequentemente aceito e que foi naturalizado, mas vem sendo problematizado, discutido fora da ideia de norma e da concepção de natural que foi atribuída às questões de sexo e gênero. Há uma tênue divisão entre sexo e gênero que precisa ser resgatada e repensada (e foi através de movimentos como o feminismo e de autores de linha pós-estruturalista), mas em si funcionam da mesma forma como “invenções sociais, que sublinha um dado biológico cuja importância, culturalmente variável, torna-se um destino natural e indispensável para a definição dos corpos. Isto significa que a materialidade do corpo existe, porém a diferença entre os sexos é uma atribuição de sentido dada aos corpos” (Swain, 2000, p. 50).
Seguindo autoras como Butler, inclusive o sexo entra como discursivo além da noção de gênero e que define atribuições e papéis em uma estrutura binária que limita a própria manifestação plural do sujeito e funciona como um dos vários pontos de relações de poder e controle. Práticas interiorizadas transformadas em regimes de verdade que inserem nos corpos discursos definidores que relacionam sexo e gênero como identidades fixas; concepções de masculinidade, feminilidade e heterossexualidade são tidas como verdades e tudo que foge a essa esfera normativa de uma realidade construída é combatido essencialmente através de preconceitos “A história do Ocidente naturaliza as relações e as funções atribuídas a mulheres e a homens, recriando-as e desenvolvendo uma política de silenciamento, que apaga a diferença, o plural e o múltiplo do humano. Neste sentido, a noção de diferença é historicamente construída” (Swain, 2000, p. 49).
Assim Alex encontra-se no limbo, em ter que escolher uma identidade sexual, passar por uma cirurgia de redesignação sexual (castração ou mutilação) e se adequar as normas que regem o masculino/feminino que tolhe essa pluralidade do ser humano; e como proposta de discussão problematizar a forma que essas relações heterossexuais e sua premissa essencial de macho/fêmea opera a complexidade que envolve a sexualidade e suas ilimitadas formas marginalizadas por esse padrão tido como normal e motor de diversos preconceitos.