Do coração e outros corações

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terça-feira, 18 de setembro de 2012

Respondendo ao Professor Ozaí


A METÁFORA GUERRA NO ARTIGO DO PROFESSOR OZAI: MAS GUERRA DE TRABALHADOR CONTRA TRABALHADOR. O ESTADO BURGUÊS? Ora, esse fica para lá!

Marta Bellini
Professora do Departamento de Fundamentos da Educação da Universidade Estadual de Maringá

O artigo do Professor Ozaí, do Departamento de Ciências Sociais, da Universidade Estadual de Maringá, As lições da greve, defendendo a greve dos funcionários da Universidade, e atacando o que ele chama de minoria mandante (professores) foi unanimidade entre os diferentes matizes de esquerda e por que não dizer também, de direita. É incrível como, no caso das esquerdas, foram esquecidas algumas lições centenárias tanto do velho Marx quanto dos velhos anarquistas.
Fez sucesso entre alunos, funcionários e alguns docentes sua declaração de que o caráter antidemocrático da Universidade sustenta-se na separação entre servidores, na “pretensa superioridade de uma minoria titulada e no domínio docente amparado na regra 70%, 15% e 15% quanto ao peso dos votos decisórios”. 
O professor aproveita-se de várias questões, mas não as explicita. Pois bem: toma a não paridade para argumentar sobre a greve dos funcionários da Universidade Estadual de Maringá como e ataca os docentes chamando-os de “minoria supostamente superior” e de “elite” da qual faz parte, (tanto que assina seu artigo como professor doutor) e está incluído na carreira desses supostamente superiores. Uma advertência: se essa minoria não seguir a carreira não tem aumento salarial. Então, toda a suposta minoria superior, inclusive o professor, também fez jus ao seu aumento salarial.
Mas, deixando de lado, essas contradições do Professor Ozaí e de seu jargão de sucesso veiculado pelo slogan “minoria de elite”, sabemos que os velhos anarquistas e marxistas nunca deixaram se corroer pelos problemas de uma corporação, mas atacaram o Estado burguês. Uma lição cara aos anarquistas.
O caráter antidemocrático das universidades decorre, antes de tudo, por ser uma instituição do ESTADO. É nisso que reside o problema central. Uma instituição universitária como parte do ESTADO tem uma burocracia formada por funcionários e professores. Às vezes, mais de funcionários do que professores. Outras mais de professores. E aí onde o professor localiza uma minoria elitista e uma maioria de trabalhadores não elitistas, a coisa se complica. A burocracia, meu caro Professor Ozaí, a mesma burocracia que liquida professores e funcionários, é formada por professores e funcionários! Essa é uma das dimensões do caráter burguês da Universidade.
Então, o que temos? Uma primeira falácia em seus argumentos. A simples divisão entre minoria que manda e uma maioria que tem que obedecer, mostra um pensamento maniqueísta e arrivista. Maniqueísta porque divide a Universidade em uma aritmética social ingênua, a de duas partes. Arrivista porque mesmo sendo professor, se identifica com a maioria supostamente frágil e vocifera palavreados em detrimento da outra. Ingenuidade ou má fé?  
É um artigo politicamente ingênuo, mas carrega na má fé. Quando o Professor Ozaí diz que os professores “estão acostumados a mandar”, aí acredito que chegamos ao cúmulo da má fé. É um artigo com tintas de revanchismo! Onde procurar o núcleo subjetivo que leva o professor ao auto-ataque? 
Não podemos esquecer a lição dos velhos anarquistas. E o professor esqueceu de que quando falamos em eleições para reitoria, por exemplo, sua aritmética social se evapora. Esqueceu que essa burocracia de funcionários e professores barganha votos. Podemos falar em COMÉRCIO DE VOTOS. Um comércio tão poderoso que mantém um grupo por mais de 20 anos no poder administrativo! E essa burocracia é ajudada por sindicalistas de plantão que domam seus filiados para esse comércio. Mais forte é essa burocracia quanto mais firme é a aliança entre sindicatos e administrações.
Veja professor Ozaí, se podemos falar de minorias aqui, temos duas, a de professores e a de funcionários que não se aceitam cargos, funções gratificadas em trocas de votos em reitores.
Resumindo seu pensamento: querendo vislumbrar uma Universidade dividiu-a em duas. Uma rica e uma pobre. E se esqueceu da banda do meio (que também rivaliza entre si formando várias facções) composta por docentes e funcionários que comandam de fato a Universidade em troca de cargos e funções gratificadas. E isso com as beneficies do ESTADO. O ESTADO, nesses casos, fecha os olhos para as irregularidades cometidas por docentes e técnicos. É bom para o ESTADO e é bom para as administrações não mexer em vespeiros. Essa burocracia apoia os governantes.
A segunda falácia do texto do professor: “greve é greve. É tão difícil de compreender assim?”. Não, professor Ozaí, não é difícil. O senhor se esqueceu de completar a frase: Greve é greve ... de funcionários. Nós, docentes, fizemos greve em agosto de 2012. E nossas assembleias respeitaram o trabalho dos funcionários e nelas discutimos democraticamente o que fazer na UEM enquanto um comando de greve estadual estava em Curitiba negociando com o Chefe da Casa Civil. Nós não ficamos em casa, nem mandamos os alunos de volta para casa, nem impedimos os funcionários de entrarem em suas salas. Nós, sabíamos que nossa pauta naquele momento era a equiparação salarial de 31,73%, equiparação defendida desde 2006 quando os técnicos negociaram com o reitor da época, sua carreira e o sindicato – que era das duas categorias – negociou com apenas a dos técnicos.

Concordo com o professor Ozaí em um quesito: a greve deu visibilidade aos funcionários, sobretudo aos funcionários que vivem uma situação dramática: zeladoras, vigilantes. Mas, a direção do sindicato e a sua visão de universidade partida em duas, mandou os professores ficarem em casa. Quem se politiza em casa? Os alunos foram para casa. Quem se politiza em casa, repito? O que os alunos dirão quando souberem que terão aulas em janeiro e fevereiro, caso a greve se prolongue? A direção do Sinteemar fez uma greve contra os professores. Por que não contra o ESTADO?

Porque – justifica o professor Ozaí – “acostumados a mandar têm dificuldade de assmilar um simples fato: a greve significa a paralisação de todas as atividades”. O professor pensa apenas a realidade cotidiana como se essa não pudesse mudar. Ninguém de nós docentes foi consultado se não poderíamos nós mesmos abrir e fechar as portas. O professor diz que nossa atividade é exclusivamente com alunos. Ora, seria ótimo se só fosse com alunos! E essa é uma função importante, o núcleo da Universidade. Mas, nós docentes somos apanhados por comissões mais diversas, para dar pareceres e dar vida às revistas da Universidade, inclusive a que o professor coordena pela PPG. Somos orientadores, trazemos centenas de bolsas para a Universidade. Essa ideia exclusiva para o aluno é verdadeira, sim: mas das salas de aulas às bolsas, das bolsas aos artigos, às pesquisas, aos inúmeros atendimentos de alunos. Isso é pouco?

E se ela é exclusivamente de sala de aula, por que não pudemos dar aulas? Se somos tão insignificantes, por que se preocupar conosco? Na verdade, aqui há uma contradição enorme, há uma falha lógica mesmo. O professor Ozaí rebaixando os professores joga a a Universidade no poço. Diz abertamente e em bom som que somos meros prestadores de serviço assim como diz o ESTADO.
Ora, leiam os discursos dos governadores. Desde Lerner passando por Requião e agora por Richa não somos professores, somos meros prestadores de serviço. Tanto é essa filosofia de prestação de serviços que o Secretário Alípio Leal propôs nesse início de ano, aqui na UEM, um banco de professores. Tem aula na UEM, um pouco na UEL e disse ele, “dá tempo para dar aulas aí fora (nas privadas)”. Afinal, somos apenas prestadores de serviço.

Essa é a dimensão menos dignificante do texto do professor Ozai. Para manter sua lógica de “greve é greve” alia-se ao pensamento neoliberal. Marx morreu. Proudhon morreu. Morreu meu querido Gustave Coubert. Estamos efetivamente na era neoliberal.  

2 comentários:

  1. Meire Calegari
    Marta Bellini, parabéns pela clareza e profundidade que tratou as questões levantadas pelo professor Ozaí.Não é preciso depreciar uma categoria para valorizar a outra.Todas são legitímas, necessárias e interdependentes.

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  2. O que me preocupa é o crescente aparelhamento funcional...Não essa ou aquela ideia..De um modo ou de outro não poderíamos sustentar esse embate...Isonomia não se compreende assim em um país onde a regra jurídico-legais vêm dominando nossa singularidade...

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