Do coração e outros corações

Do coração e outros corações

domingo, 25 de março de 2012

 Enviado pelo amigo Grozny Arruda, RJ
Grata!
FRASE DO DIA“

Na Corruptolândia, capital Corruptília, não haverá honestidade, logo não haverá pobres, pois pobre é que tem mania de ser honesto, assim como honesto tem a desgraça de ser pobre. E eu quero que pobre se exploda!

“Deputado Justo Veríssimo, um dos 209 personagens de Chico Anysio”.

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Demóstenes Torres emprega em cargo de confiança em seu gabinete uma familiar de Gilmar Mendes. Senador é citado em apuração sobre jogo ilegal, caso que pode ir ao STF; ele e Mendes negam conflito de interesse

Leandro Colon e Fernando Mello, Folha de S. Paulo 

Sob risco de virar alvo do STF (Supremo Tribunal Federal), o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) emprega em seu gabinete uma enteada de Gilmar Mendes, um dos 11 ministros da corte.


Ketlin Feitosa Ramos, que é tratada na família como filha do ministro, ocupa desde setembro o cargo de assessora parlamentar de Demóstenes, posto de confiança e livre nomeação.
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Os 30% de Demóstenes
Leandro Fortes, CartaCapital

A Polícia Federal tem conhecimento, desde 2006, das ligações do bicheiro Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, com o senador Demóstenes Torres, do DEM de Goiás.

Três relatórios assinados pelo delegado Deuselino Valadares dos Santos, então chefe da Delegacia de Repressão a Crimes Financeiros (DRCOR), da Superintendência da PF em Goiânia, revelam que Demóstenes tinha direito a 30% da arrecadação geral do esquema de jogo clandestino, calculada em, aproximadamente, 170 milhões de reais nos últimos seis anos.

Segundo relatório da Polícia Federal, 30% é o percentual que o senador do DEM recebia do bicheiro Carlinhos Cachoeira.

Na época, o império do bicheiro incluía 8 mil máquinas ilegais de caça-níqueis e 1,5 mil pontos de bingos. Como somente no mês passado a jogatina foi desbaratada, na Operação Monte Carlo, as contas apresentadas pela PF demonstram que a parte do parlamentar deve ter ficado em torno de 50 milhões de reais.

O dinheiro, segundo a PF, estava sendo direcionado para a futura candidatura de Demóstenes ao governo de Goiás, via caixa dois.

A informação, obtida por CartaCapital, consta de um Relatório Sigiloso de Análise da Operação Monte Carlo, sob os cuidados do Núcleo de Inteligência Policial da Superintendência da PF em Brasília. Dessa forma, sabe-se agora que Demóstenes Torres, ex-procurador, ex-delegado, ex-secretário de Segurança Pública de Goiás, mantinha uma relação direta com o bando de Cachoeira, ao mesmo tempo em que ocupava a tribuna do Senado Federal para vociferar contra a corrupção e o crime organizado no País.

O senador conseguiu manter a investigação tanto tempo em segredo por conta de um expediente tipicamente mafioso: ao invés de se defender, comprou o delegado da PF.

Deuselino Valadares foi um dos 35 presos pela Operação Monte Carlo, em 29 de fevereiro. Nas intercepções telefônicas feitas pela PF, com autorização da Justiça, ele é chamado de “Neguinho” pelo bicheiro. Por estar lotado na DRCOR, era responsável pelas operações policiais da Superintendência da PF em todo o estado de Goiás.

Ao que tudo indica, foi cooptado para a quadrilha logo depois de descobrir os esquemas de Cachoeira, Demóstenes e mais três políticos goianos também citados por ele, na investigação: os deputados federais Carlos Alberto Leréia (PSDB), Jovair Arantes (PTB) e Rubens Otoni (PT).

Escutas da Operação Monte Carlo mostram que o bicheiro citou mais três políticos goianos: Rubens Otoni (PT) (à esquerda), Carlos Alberto Leréia (PSDB) (centro) e Jovair Arantes (PTB).

Ao longo da investigação, a PF descobriu que, nos últimos cinco anos, o delegado passava informações sigilosas para o bando e enriquecia a olhos vistos. Tornou-se dono de uma empresa, a Ideal Segurança Ltda, registrada em nome da mulher, Luanna Bastos Pires Valadares. A firma foi montada em sociedade com Carlinhos Cachoeira para lavar dinheiro. Também comprou fazendas em Tocantins, o que acabou por levantar suspeitas e resultar no afastamento dele da PF, em 2011.
O primeiro relatório do delegado Deuselino Valadares data de 7 de abril de 2006, encaminhado à Delegacia de Repressão a Crimes Contra o Patrimônio (Delepat) da PF em Goiânia. Valadares investigava o escândalo da Avestruz Master, uma empresa que fraudou milhares de investidores em Goiás, quando conheceu o advogado Ruy Cruvinel.
Cruvinel chamou Valadares para formar uma parceria a fim de criar “uma organização paralela” à de Carlinhos Cachoeira. O suborno, segundo o delegado, seria uma quantia inicial de 200 mil reais. Ele, ao que parece, não aceitou e decidiu denunciar o crime.
Em 26 de abril de 2006, o relatório circunstanciado parcial 001/06, assinado por Deuselino Valadares, revelou uma ação da PF para estourar o cassino de Ruy Cruvinel, no Setor Oeste de Goiânia. Preso, Cruvinel confessou que, dos 200 mil reais semanais auferidos pelo esquema (Goiás e entorno de Brasília), 50%, ou seja, 100 mil reais, iam diretamente para os cofres de Carlinhos Cachoeira.
Outros 30% eram destinados ao senador Demóstenes Torres, cuja responsabilidade era a de remunerar também o então superintende de Loterias da Agência Goiânia de Administração (Aganp), Marcelo Siqueira. Ex-procurador, Siqueira foi indicação de Demóstenes e do deputado Leréia para o cargo.
Curiosamente, ao assumir a função, um ano antes, ele havia anunciado que iria “jogar duro” contra o jogo ilegal em Goiás.
Em 31 de maio de 2006, de acordo com os documentos da Operação Monte Carlo, Deuselino Valadares fez o relatório derradeiro sobre o esquema, de forma bem detalhada, aí incluído um infográfico do “propinoduto” onde o bicheiro é colocado no centro de uma série de ramificações criminosas, ao lado do senador do DEM e do ex-procurador Marcelo Siqueira. Em seguida, misteriosamente, o delegado parou de investigar o caso.
“Verificado todo o arquivo físico do NIP/SR/DPF/GO não foi localizado nenhum relatório, informação ou documentos de lavra do DPF DEUSELINO dando conta de eventual continuidade de seus contatos com pessoas ligadas à exploração de jogos de azar no Estado de Goiás”, registrou o delegado Raul Alexandre Marques de Souza, em 13 de outubro de 2011, quando as investigações da Monte Carlo estavam em andamento.
A participação do senador Demóstenes Torres só foi novamente levantada pela PF em 2008, quando uma operação também voltada à repressão de jogo ilegal, batizada de “Las Vegas”, o flagrou em grampos telefônicos em tratativas com Carlinhos Cachoeira.
Novamente, o parlamentar conseguiu se safar graças a uma estranha posição da Procuradoria Geral da República, que recebeu o inquérito da PF, em 2009, mas jamais deu andamento ao caso.

Chalitando...

Roberto Romano:

Índice geralSão Paulo, sábado, 24 de março de 2012Poder
Poder

Foco
Em aula a aspirantes a vereador, Chalita vai da Bíblia a Aristóteles

Marlene Bergamo/Folhapress
Pré-candidato do PMDB em SP, Gabriel Chalita, dá aula a aspirantes a vereador de sua sigla
Pré-candidato do PMDB em SP, Gabriel Chalita, dá aula a aspirantes a vereador de sua sigla
RODRIGO VIZEU
DE SÃO PAULO
Munido de Aristóteles, Sócrates e dicas de Twitter, o pré-candidato do PMDB à Prefeitura de São Paulo, Gabriel Chalita, deu a aula inaugural do curso para formar os aspirantes a candidato a vereador do partido.
Filósofo e professor de direito, o deputado federal ensinou a cerca de 80 alunos, na noite de anteontem, os princípios da ética aristotélica, "um código de conduta que visa um bem".
Ele cobrou que os pré-candidatos não falem só o que suas plateias querem ouvir, já que "Sócrates diz que você tem que acreditar no seu discurso". "Um candidato a vereador que não tiver sonho não é um bom candidato a vereador", afirmou.
Chalita também buscou dicas eleitorais em São Tomás de Aquino ("Não faça ao outro o que você não gostaria que fizessem com você") e na Bíblia ("Só se ama o que se conhece").
Ao enumerar as funções da retórica de acordo com Aristóteles, disse que é preciso ter "hermenêutica" para interpretar a cidade.
Como exemplo da importância de que o político diga a verdade, relatou sua saída do PSDB mesmo após ser alertado de que o então governador, José Serra, poderia não gostar. "As pessoas diziam: 'ele é perigoso, destrói as pessoas'. Mas eu precisava dizer o que eu acreditava."
Chalita lembrou que os pré-candidatos ainda não podem pedir votos. Também sugeriu que os alunos não batam boca nas redes sociais e distribuiu uma lista para que todos anotassem seus perfis no Twitter.
Um dos alunos quis saber se, recém-convertido evangélico, poderia pedir votos para os velhos amigos da escola de samba. Chalita não viu problemas

Sen-ATOR

Roberto Romano: 



Um governo refém de autoridades religiosas

Para o sociólogo Pedro Ribeiro de Oliveira, o governo Dilma está enredado por chantagens de autoridades religiosas, e “dança conforme a música”

Por: Graziela Wolfart e Márcia Junges

“Não é de teses que o governo tornou-se refém, mas sim de autoridades religiosas que buscam imobilizá-lo por meio de chantagens. Em vez de resistir, o governo deixou-se enredar. Ora, contra a chantagem só há uma saída: resistir ao chantagista trazendo-o para a luz do dia, isto é, obrigando-o ao debate público sobre suas propostas”. A afirmação é do sociólogo Pedro Ribeiro de Oliveira, que questiona: “Se a maioria da população rejeita a política e aceita a religião, por que o governo seria diferente?” Em seu ponto de vista, Dilma possui como meta a integração total do Brasil com o sistema capitalista mundial. “Quem paga o custo desse crescimento é o sistema de vida do Planeta – mas ele não tem voz para protestar”. Exceto oportunidades bastante raras, não existe mais um debate das políticas do governo e do Estado. “A política foi reduzida à disputa por cargos no governo e ao processo eleitoral”, sentencia, na entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line.

Pedro Ribeiro de Oliveira é doutor em Sociologia pela Université Catholique de Louvain, na Bélgica. Atualmente é professor do PPG em Ciências da Religião da PUC-Minas. Dentre suas obras, destacamos Fé e Política: fundamentos (Aparecida: Ideias & Letras, 2004), Reforçando a rede de uma Igreja missionária (São Paulo: Paulinas, 1997) e Religião e dominação de classe (Petrópolis: Vozes, 1985).
Confira a entrevista.

IHU On-Line – A partir da conjuntura política nacional atual, como o senhor percebe a autonomia do Estado em relação à religião?

Pedro Ribeiro de Oliveira –
 Vamos começar pela apreciação do rumo político dos governos Lula e Dilma, porque isso ajuda a esclarecer a relevância que a religião adquiriu no cenário político brasileiro. Tal como Lula, Dilma tem como meta a plena integração do Brasil no sistema capitalista mundial, não mais pelo alinhamento aos interesses dos EUA – como foi até Fernando Henrique Cardoso – e sim pela abertura à China e aos países do “grande Sul”. Numa conjuntura econômica favorável, essa política resultou no crescimento do PIB e na distribuição da renda (não da riqueza!). Assim, o atual governo pode satisfazer praticamente todas as classes sociais: trabalhadores, aposentados e pensionistas galgam um patamar mais elevado de consumo, banqueiros têm lucros nunca vistos, empresários do agronegócio e da mineração são favorecidos, servidores públicos recuperam o poder aquisitivo. Enfim, praticamente todos têm a sensação de serem beneficiados pela atual política macroeconômica. Quem paga o custo desse crescimento é o sistema de vida do Planeta – mas ele não tem voz para protestar.

Diante desse amplo apoio na sociedade, só quebrado pelas manifestações contrárias de quem se preocupa com a vida do Planeta, o governo Dilma aprofundou o processo de despolitização iniciado por Lula. Salvo raros momentos, não se debatem mais as políticas do governo e do Estado. A política foi reduzida à disputa por cargos no governo e ao processo eleitoral. Esse é pano de fundo para minhas respostas à entrevista.

IHU On-Line – De forma geral, qual a importância da religião no cenário político nacional atual? Como a presidente Dilma está lidando com este aspecto?

Pedro Ribeiro de Oliveira –
 Quando os partidos políticos abdicam de sua função própria de criticar e de apresentar propostas de políticas públicas e se contentam em disputar cargos e benesses, outras entidades passam a ocupar aquela função. É o caso das igrejas que, no vazio deixado pelos partidos, ganham força política. E a presidente Dilma está mostrando ter pouca habilidade para lidar com Igrejas que fazem política, especialmente se fazem uma política mesquinha. Talvez isso se deva a seu passado militante em autênticos partidos políticos, somado à pouca participação em alguma igreja. Dificilmente caberia em sua teoria esta realidade de igrejas em disputa por benesses políticas.

IHU On-Line – Como percebe que uma linguagem com fundo religioso sobe cada vez mais ao palco de um Estado que se quer laico? Não vê uma contradição aqui?

Pedro Ribeiro de Oliveira –
 Não é bem uma contradição, mas uma concessão ao ambiente sociocultural brasileiro: o governo dança conforme a música. Se a maioria da população rejeita a política e aceita a religião, por que o governo seria diferente? Ele deixa nos bastidores sua meta política de plena inserção no sistema capitalista mundial e traz para o palco midiático as propostas ao gosto das massas, sejam elas de fundo religioso ou tratem de futebol, segurança, habitação, ensino e outras.

IHU On-Line – O governo Dilma estaria sendo refém de teses conservadoras capitaneadas por setores das igrejas pentecostais, neopentecostais e católica? Religião interferindo demais na política não força um conservadorismo perigoso?

Pedro Ribeiro de Oliveira –
 Não é de teses que o governo tornou-se refém, mas sim de autoridades religiosas que buscam imobilizá-lo por meio de chantagens. Em vez de resistir, o governo deixou-se enredar. Ora, contra a chantagem só há uma saída: resistir ao chantagista trazendo-o para a luz do dia, isto é, obrigando-o ao debate público sobre suas propostas. Se o governo abrisse um amplo debate com a sociedade – penso no Parlamento, nos Conselhos de Cidadania, em universidades e em parcerias com ONGs – e lhes desse divulgação midiática, constataria que não há tanto consenso nas igrejas como elas deixam transparecer. Refiro-me aqui a oposição das igrejas (ou, mais precisamente, de algumas igrejas) à descriminalização do aborto e da eutanásia, à distribuição de preservativos, à educação sexual nas escolas, ao combate à homofobia, e sua insistência no ensino confessional nas escolas públicas. Na ausência de um debate, contudo, a posição da autoridade eclesiástica – pastores, padres e bispos – emerge como a única.

IHU On-Line – Como o senhor analisa a nomeação do senador Marcello Crivella (PRB-RJ) para o Ministério da Pesca?

Pedro Ribeiro de Oliveira –
 Crivella sempre defendeu no Senado os interesses corporativos de igrejas neopentecostais, como a regulamentação da profissão de teólogo. Alçado agora à posição de ministro, ele terá acesso mais direto à presidente para fazer suas reivindicações e assim atender a suas bases. Mas é preciso ter presente que seu ministério não é sem importância, porque a pesca é um dos principais fatores de extinção de espécies aquáticas e falta uma política pública bem equacionada para o setor. Se ele tiver um comportamento realmente republicano e olhar em primeiro lugar os interesses nacionais e do sistema de vida do Planeta, poderá trazer uma grande contribuição, mas muito me surpreenderia se isso acontecer.

IHU On-Line – Como o senhor interpreta a posição da presidente Dilma em recuar e suspender a distribuição do kit anti-homofobia nas escolas? O que esse gesto sinaliza sob a condução da questão da homossexualidade no governo?

Pedro Ribeiro de Oliveira –
 Há no caso uma questão eleitoral: a candidatura de F. Haddad em São Paulo, que não pode desperdiçar nenhum voto sob pena de perder a eleição. Nessa caça aos votos dos evangélicos a concorrência é feroz, e, sendo em geral um eleitorado pouco politizado, a argumentação política tem menos força do que uma argumentação religiosa ou moralista. Lamento ver o governo Dilma abrir mão de propostas políticas inovadoras por medo de perder uma eleição municipal.

IHU On-Line – O senhor percebe um enfraquecimento da influência dos setores progressistas da Igreja Católica no governo? Os fundamentos da Teologia da Libertação se perderam no governo Dilma?

Pedro Ribeiro de Oliveira –
 Não há enfraquecimento porque o único momento em que eles tiveram alguma influência na presidência da República foi nos dois primeiros anos do governo Lula. Na medida em que o PT conduzido por Lula se transformou em partido do governo e consolidou sua aliança com o PMDB e outros grupos para eleger Dilma, foi-se acabando o espaço para um projeto de libertação. É só lembrar o abandono da reforma agrária e dos Direitos dos Povos Indígenas, o desrespeito à ecologia e à biodiversidade, o assistencialismo das políticas sociais e a despolitização geral. Hoje, a ideia-força da libertação está fora do governo – e também da igreja. Seu espaço é apenas a sociedade, e, ainda assim, somente ali onde o povo se organiza com autonomia.

Nasceu um, morreu múltiplo!

Do facebook

quarta-feira, 21 de março de 2012

Thor: eu tenho a força!

Roberto Romano: A Folha de São Paulo e sua preferência pelos ricos

Imprudência de ciclista poderia ter matado meu filho, diz Eike

(Nota: o ciclista morreu!)
 O empresário Eike Batista afirmou que o acidente em que se envolveu seu filho Thor ocorreu por imprudência do ciclista, que morreu na ocasião. "A imprudência do ciclista causou, infelizmente, a sua morte. Mas podia ter levado três pessoas [Thor e o amigo que estava com ele no carro]", afirmou.
A declaração foi feita em entrevista à colunista Mônica Bergamo, publicada na na edição desta terça-feira daFolha. A entrevista completa está disponível para assinantes do jornal e do UOL, empresa controlada pelo Grupo Folha, que edita a Folha.
Ontem, o jovem já havia afirmado em seu Twitter que dirigia com cuidado e que "repentinamente" um ciclista atravessou do acostamento em sua direção. "Me recordo que Wanderson [o ciclista] empurrava a bicicleta com o pé esquerdo no chão. Sentado, porém, no banco da bicicleta", escreveu.
O advogado Cléber Carvalho, que representa a família da vítima disse, porém, ter testemunhas de que o ciclista trafegava no acostamento quando foi atropelado.
Um extrato obtido pelo "Jornal Nacional", da Rede Globo, aponta que Thor Batista somou 51 pontos em sua carteira de habilitação em um ano e meio.

Nicson Olivier - 17.mar.12/Folhapress
Mercedes SLR McLaren de Thor Batista, destruído após atropelamento de ciclista no Rio; veja imagens
Mercedes SLR McLaren de Thor Batista, destruído após atropelamento de ciclista no Rio; veja mais imagens
Bem amadores.

segunda-feira, 19 de março de 2012

Rosa, a Vermelha

É sabido que depois da cisão entre os bolcheviques e os mencheviques russos, consumada em 1904, a polaca-alemã Rosa Luxemburgo se opôs a Lenine e à sua conceção autoritária de centralismo democrático. Aliás, em 1918 chamou de novo a atenção para a tentação de confundir a ditadura do partido com a do proletariado. E, quando estes começaram a excluir «todos aqueles que pensam de maneira diferente», não deixou de criticar aos bolcheviques o esvaziamento da democracia dos sovietes a que essa política inevitavelmente conduziria. A mais conhecida das suas citações, retirada de um texto publicado na altura, é, aliás, «a liberdade é sempre a liberdade de quem pensa de forma diferente». Pode ainda recordar-se uma outra frase, também do ano seguinte ao da revolução soviética: «Sem eleições gerais, sem uma liberdade de imprensa e de reunião sem restrições, sem um forte combate de ideias, a vida de toda a instituição pública morre, tornando-se uma mera aparência de vida na qual só a burocracia permanece como elemento ativo». Quando se completam 141 anos sobre o nascimento de Rosa, é caso para dizer que a História foi madrasta ao levá-la tão cedo – morta em Berlim em 1919, durante a revolta spartakista, às mãos das milícias da direita, e não da social-democracia alemã como se mente por aí –, poupando a Vladimir Ilitch a refutação de uma voz à altura. Provavelmente a história geral do socialismo seria contada hoje de um modo bastante diferente.

Triste Síria

Entrevista a Christophe de Dejours do jornal Política, Portugal ver aqui

"Um suicídio no trabalho é uma mensagem brutal"

01.02.2010 - 10:14 Por Ana Gerschenfeld
Christophe DejoursChristophe Dejours (foto de Enric Vives-Rubio)
Nos últimos anos, três ferramentas de gestão estiveram na base de uma transformação radical da maneira como trabalhamos: a avaliação individual do desempenho, a exigência de “qualidade total” e o outsourcing. O fenómeno gerou doenças mentais ligadas ao trabalho. Christophe Dejours, especialista na matéria, desmonta a espiral de solidão e de desespero que pode levar ao suicídio.


Psiquiatra, psicanalista e professor no Conservatoire National des Arts et Métiers, em Paris, Christophe Dejours dirige ali o Laboratório de Psicologia do Trabalho e da Acção – uma das raras equipas no mundo que estuda a relação entre trabalho e doença mental. Esteve há dias em Lisboa, onde, de gravata amarela, cabeleira “à Beethoven” e olhos risonhos a espreitar por detrás de pequenos óculos de massa redondos, falou do sofrimento no trabalho. Não apenas do sofrimento enquanto gerador de patologias mentais ou de esgotamentos, mas sobretudo enquanto base para a realização pessoal. Não há “trabalho vivo” sem sofrimento, sem afecto, sem envolvimento pessoal, explicou. É o sofrimento que mobiliza a inteligência e guia a intuição no trabalho, que permite chegar à solução que se procura. 

Claro que no outro extremo da escala, nas condições de injustiça ou de assédio que hoje em dia se vivem por vezes nas empresas, há um tipo de sofrimento no trabalho que conduz ao isolamento, ao desespero, à depressão. No seu último livro, publicado há uns meses em França e intitulado Suicide et Travail: Que Faire? , Dejours aborda especificamente a questão do suicídio no trabalho, que se tornou muito mediática com a vaga de suicídios que se verificou recentemente na France Télécom.

Depois da conferência, o médico e cientista falou com o P2 sobre as causas laborais desses gestos extremos, trágicos e irreversíveis. Mais geralmente, explicou-nos como a destruição pelos gestores dos elos sociais no trabalho nos fragiliza a todos perante a doença mental.

O suicídio ligado ao trabalho é um fenómeno novo? 
O que é muito novo é a emergência de suicídios e de tentativas de suicídio no próprio local de trabalho. Apareceu em França há apenas 12, 13 anos. E não só em França – as primeiras investigações foram feitas na Bélgica, nas linhas de montagem de automóveis alemães. É um fenómeno que atinge todos os países ocidentais. O facto de as pessoas irem suicidar-se no local de trabalho tem obviamente um significado. É uma mensagem extremamente brutal, a pior do que se possa imaginar – mas não é uma chantagem, porque essas pessoas não ganham nada com o seu suicídio. É dirigida à comunidade de trabalho, aos colegas, ao chefe, aos subalternos, à empresa. Toda a questão reside em descodificar essa mensagem. 

Afecta certas categorias de trabalhadores mais do que outras? 
Na minha experiência, há suicídios em todas as categorias – nas linhas de montagem, entre os quadros superiores das telecomunicações, entre os bancários, nos trabalhadores dos serviços, nas actividades industriais, na agricultura. 

No passado, não havia suicídios ligados ao trabalho na indústria. Eram os agricultores que se suicidavam por causa do trabalho – os assalariados agrícolas e os pequenos proprietários cuja actividade tinha sido destruída pela concorrência das grandes explorações. Ainda há suicídios no mundo agrícola. 

O que é que mudou nas empresas? 
A organização do trabalho. Para nós, clínicos, o que mudou foram principalmente três coisas: a introdução de novos métodos de avaliação do trabalho, em particular a avaliação individual do desempenho; a introdução de técnicas ligadas à chamada “qualidade total”; e o outsourcing, que tornou o trabalho mais precário. 

A avaliação individual é uma técnica extremamente poderosa que modificou totalmente o mundo do trabalho, porque pôs em concorrência os serviços, as empresas, as sucursais – e também os indivíduos. E se estiver associada quer a prémios ou promoções, quer a ameaças em relação à manutenção do emprego, isso gera o medo. E como as pessoas estão agora a competir entre elas, o êxito dos colegas constitui uma ameaça, altera profundamente as relações no trabalho: “O que quero é que os outros não consigam fazer bem o seu trabalho".
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A Ana C. enviou-nos a entrevista. Oportuna porque aqui, na Universidade Estadual de Maringá, o Laboratório de Estudos e Pesquisa em Psicanálise e Civilização, do Dep. de Psicologia receberá o Dejours nos dias 16 a 18 de abril. Informações nos fones: (44) 3011-3871 ou 3011-4291 

domingo, 18 de março de 2012

Feminismo, feminismo...

A «palavra feia»

À volta das comemorações do dia 8 de março estão instalados três círculos de pseudo-apoiantes, mas reais adversários, que baseiam a sua atitude numa distorção da dimensão política do combate das mulheres pela igualdade. O primeiro, o mais visível, o mais poderoso também, transforma a data em instrumento de negócio, forçando os consumidores, homens ou mulheres, a despender dinheiro para oferecerem prendas que são afinal a figuração simbólica da própria subalternidade. Nada contra a compra de flores ou de tratamentos de beleza, obviamente, mas estes nada têm a ver com a luta pública das mulheres pelos seus direitos. O segundo círculo é mais insidioso, integrando os cidadãos, muitos deles mulheres, que consideram ter a emancipação completado já o seu caminho, ou atingido os seus limites, não havendo pois lugar a grandes causas ou preocupações. Uma atitude que faz baixar as guardas e pactua com os inúmeros casos de desigualdade e de ausência de direitos que permanecem uma constante fora de territórios sociais e culturais privilegiados.
Já o terceiro círculo, apesar de mais pequeno, é particularmente perigoso, dado poder funcionar como um cavalo de Tróia. Ele integra aquele grupo de pessoas que se declara pelos direitos das mulheres mas faz questão de se proclamar «não-feminista» ou mesmo «antifeminista». Neste campo pode encontrar-se um grande número de mulheres, algumas mesmo informadas e que se consideram emancipadas, muitas vezes em lugares de destaque, que exibem esta atitude por terem do feminismo, «palavra feia», da sua pluralidade e da sua história, bem como dos seus atuais combates, uma conceção caricatural. Será uma banalidade escrevê-lo, mas vale a pena repetir: não, ser feminista, não é «ser contra os homens», não é detestar que lhe ofereçam flores, não é odiar o espaço da casa, não é abominar a maternidade, não é usar botas cardadas, não é ser (necessariamente) lésbica ou promíscua, embora existam mulheres feministas que pratiquem ou sejam tudo isso, como existem pessoas, de esquerda ou de direita, que se diferenciam, e muito, de outras que partilham convicções políticas análogas. Um feminismo sem diversidade – e sem a pequena componente radical – seria aliás, ele sim, coisa de assustar. O Dia Internacional de Mulher evoca também, atualmente, a luta contra o preconceito e contra este triplo cerco.

...

Papéis Roubados #17

Numa (como sempre) desassombrada entrevista concedida à Philosophie Magazine de Março deste ano («Ce qui importe, c’est la théorie. Je n’existe pas»), Slavoj Žižek reflete de maneira bem pouco consensual sobre algumas das expetativas e das escolhas da esquerda. Aqui fica parte da conversa, traduzida do francês.
P: Então o nosso atual modelo de democracia não é aquele que convém para lutar contra o capitalismo?
Não, claro que não, defendo mesmo o contrário! Nós dispomos, sem dúvida, de uma liberdade formal – mais ela é mesmo a única liberdade que resta. Se abolirmos a democracia formal, não obtemos a democracia real e perdemos a democracia enquanto tal. O único espaço de liberdade do qual dispomos reside nesse interstício entre a democracia formal e a forma adotada pela nossa efetiva falta de liberdade. O problema de saber de que forma ultrapassa o reinado todo-poderoso do dinheiro preservando a nossa liberdade é um problema muito sério. Eu não compro essas expressões-feitas marxistas: Vergesellschaftung, por exemplo, a «sociação», ou «o coletivo»… Ah! Ah! A que soam tais coisas?
P: Para si a forma é então a chave?
Completamente!
P: Mas você já escreveu: «Aquilo que impede hoje todo o questionamento radical do capitalismo é a crença na forma democrática da luta contra o capitalismo.»
Eu reformulo desta maneira: odeio 1968. Demasiada liberdade, demasiada fruição. Mas uma coisa pode salvar-se, essa mensagem de base avançando que a política se encontra também naquelas esferas (…) em que certas coisas acontecem: a subordinação das mulheres, as relações no seio da família, o que realmente se passa diariamente nas fábricas… em todos esses domínios põe-se a questão da liberdade, da política. Eis o maior problema: não abolir a democracia formal, mas como integrar igualmente essas esferas nos processos democráticos? | Clique para continuar a ler este texto »

de Roberto Romano

Índice geralSão Paulo, domingo, 18 de março de 2012Ilustrissima
Ilustrissima

Arte
Notícias da cidade proibida
Censurado pela ditadura chinesa, Ai Weiwei fala à Folha

Ai Weiwei/Divulgação Museu Jeu de Paume
Da série "Terremoto em Sichuan", 2008-2010
Da série "Terremoto em Sichuan", 2008-2010
RESUMO Sob forte perseguição do regime comunista em seu país, o artista e ativista chinês Ai Weiwei desafia a censura e dá entrevista à Folha. Retrospectiva no museu parisiense Jeu de Paume traz questões sobre os limites entre o artístico e o político em sua obra (veja galeria de imagens da mostra em folha.com/ilustrissima).
FABIANO MAISONNAVE
FOTOS AI WEIWEI
Diante da enorme casa-estúdio, uma câmera presa a um poste aponta para a porta de entrada, recortada no muro alto. Ao lado, o motorista de um caminhão estacionado bem na porta -distante apenas para não obstruir a vigilância eletrônica- encara sem qualquer pudor quem entra e sai.
O aparato é apenas a parte visível do cerco a Ai Weiwei, 54. O artista mais reputado da China no exterior está em prisão domiciliar desde junho, depois de ter passado 81 dias na cadeia.
Ao ser libertado, Ai Weiwei teve de assinar um termo comprometendo-se a não falar com estrangeiros, poupar o governo de críticas e abandonar o Twitter. Mas ele não vem cumprindo nada disso.
Uma das violações foi a entrevista que concedeu à Folha na semana passada. Com as roupas puídas e sua icônica barba mais malcuidada do que nas fotos, ele praticamente só falou de política. Fez críticas ao regime num inglês polido por 12 anos em Nova York, em tom baixo e cheio de pausas.
Mais próximo à arte, seu único grande trabalho nos últimos meses tem sido pintar cartões de agradecimento às 30 mil pessoas que lhe doaram dinheiro para pagar a enorme multa imposta pelo regime, que o acusa de sonegação tributária. Dez mil já foram enviados.
"Não há muito para ver, é tudo muito simples", diz Ai Weiwei, antes de abrir a porta do enorme ateliê, quase vazio. Ali, mostra duas esferas de madeira, feitas com pau-rosa brasileiro sem o uso de pregos. "É para uma exposição na Europa", limita-se a dizer.
Os 81 dias na cadeia foram apenas o choque mais recente em sua relação com o Partido Comunista chinês, turbulenta desde a infância do artista. O seu pai, o poeta Ai Qing (1910-96), caiu em desgraça na Campanha Antidireitista, expurgo maoísta contra intelectuais. Weiwei tinha poucas semanas de vida, quando, em 1957, Ai Qing foi rotulado como "inimigo do povo" e os cinco membros da família foram enviados para um período de "reeducação" na fria província de Heilongjiang, na fronteira russa.
Dois anos depois, os Ai foram transferidos para a "pequena Sibéria", a ainda mais desolada região de Xinjiang (noroeste), à beira do deserto de Gobi. "Primeiro moramos num dormitório, depois numa 'cova de barro' -fosso cavado no chão, coberto por ramos de árvore e lama. Quando a desocupamos, foi transformada em chiqueiro", escreveria Ai Weiwei. Ai Qing era obrigado a limpar banheiros públicos. Foram 16 anos ali.
PEQUIM Voltaram para Pequim em 1976, com o fim da Revolução Cultural (1966-76). Dois anos depois, Ai Weiwei entrou na Academia de Filmes de Pequim e começou a se envolver num movimento pró-democracia que o governo não demorou a desarticular. Desiludido, em 1981 mudou-se com a namorada para Nova York.
Nos 12 anos de EUA, o futuro artista conheceu as obras de Andy Warhol e Marcel Duchamp, trabalhou como carpinteiro e pintor de paredes, recepcionou artistas chineses. Voltou à China em 1993 para cuidar do pai doente.
A fama chegou em 2005, ao lançar um blog. Gastava horas publicando imagens e textos que iam se tornando cada vez mais politizados. O auge foi durante o terremoto de Sichuan (2008), quando se envolveu na investigação da morte de milhares de crianças, esmagadas nos escombros de escolas mal construídas pelo Estado.
O governo passou a apagar posts até que o blog inteiro foi retirado do ar, em maio de 2009. Com ele, foi-se todo o arquivo digital. O blog foi publicado em livro nos EUA e neste ano deve ganhar edição brasileira, pela Martins. Foi logo substituído pelo Twitter. Bloqueado na China, o serviço de microblogs pode ser acessado por VPN, rede privada que permite burlar a censura.
Ai Weiwei continuou apoiando investigações sobre o terremoto. Em agosto de 2009, viajou a Chengdu, em Sichuan, para acompanhar o julgamento de Tan Zuoren, ativista preso ao tentar listar os nomes da crianças mortas.
Durante uma madrugada, teve o quarto invadido e foi golpeado na cabeça. O estrago só seria percebido um mês depois, numa viagem à Alemanha. Depois de passar mal, recebeu o diagnóstico de hemorragia cerebral e foi operado.
Em outubro de 2010, Ai Weiwei festejou o Prêmio Nobel da Paz concedido ao dissidente preso Liu Xiaobo. Dois meses depois, seu ateliê em Xangai, que custou US$ 1,2 milhão, foi considerado uma "construção ilegal" e demolido. Quatro de seus colaboradores foram presos, sob acusação de sonegação fiscal. No começo de agosto, ele acusou no Twitter a polícia de tê-los prendido e torturado.
Voltou à carga em artigo publicado na revista "Newsweek". Pequim é descrita como um "pesadelo permanente", dividida entre a elite enriquecida graças às relações com o governo e a massa de migrantes escravizados.
"Na semana passada", escreve, "estive num parque, e algumas pessoas se aproximaram e me fizeram um sinal positivo ou deram tapinhas no meu ombro. Por que precisam fazer isso de forma tão sigilosa? Ninguém tem vontade de se manifestar. O que elas estão esperando? Elas sempre me dizem: 'Weiwei, deixe o país, por favor'. Ou: 'Viva mais tempo e deixe-os morrer'. É sempre ir embora ou ser paciente e vê-los morrer. Eu realmente não sei o que vou fazer."
O governo também não sabe.
Folha - Como tem sido a sua rotina desde que deixou a prisão?
Ai Weiwei - Fui preso quase um ano atrás, no dia 3 de abril. Fui solto depois de 81 dias de detenção. Nunca fui preso oficialmente, não há até hoje um papel dizendo que fui oficialmente preso, não há acusação oficial, apenas verbal, não houve processo. Fiquei preso por 81 dias numa ação secreta.
Cobriram meu rosto, me levaram a um lugar secreto, me algemaram e me interrogaram mais de 50 vezes. Fizeram vídeos, tiraram digitais e todas aquelas fotografias. Tive de concordar por escrito com vários procedimentos, fui transferido várias vezes. Aí me deixaram sair, também sem explicação.
No dia em que saí, eles me deram uma ordem de que estava sob liberdade condicional por um ano. Isso foi em 22 de junho, então faltam três meses. Sob essas condições, não posso usar a internet, não posso falar com estrangeiros nem com a imprensa estrangeira, não posso escrever artigos.
Obviamente, não posso dar opinião sobre nenhum evento social nem sobre direitos humanos, não posso dizer o que aconteceu durante a detenção. E muitas, muitas outras regras proibitivas.
Outra condição é que fique em Pequim. Meu passaporte foi confiscado. Se quiser pôr os pés fora de casa, tenho de informar por telefone. Do contrário, terei de ir uma ou duas vezes por semana à delegacia de polícia papara me dizerem o que violei.
Além disso, estou trabalhando na minha arte, o que é de certa forma incentivado: faça a sua arte, mas não critique o governo, não dê a sua opinião sobre a sociedade.
E você faz exatamente o contrário.
Eu tinha dois militares à minha frente todo o tempo, por 24 horas, não podia falar, nem sequer tocar o meu rosto. Tudo precisava ser reportado, se eu queria me levantar para urinar ou beber água. Se autorizassem, eu podia ir.
Nessas condições, você diz: "Tá, não vou criticar o governo". Mas, quando está livre -embora eu não esteja bem livre, mas talvez mais que antes-, as condições mudam.
Acredito na liberdade, que dar o seu pensamento, as suas ideias, comunicar-se com outras pessoas, faz parte da vida. Parar com isso seria o mesmo que estar na prisão de novo. Aqui fora, nunca vou poder ser livre... Eu bem que tentei. A definição de um homem livre é exercitar livremente seus direitos.
Você tem criticado a nova lei criminal chinesa, que amplia os poderes do Estado para prender indivíduos. Como imagina o seu futuro?
O meu futuro é desconhecido. O problema é esse tipo de poder com o qual você nunca pode debater, se comunicar. Você não sabe o que, exatamente, é errado, não pode dizer o que pensa, não vão escutar.
Fui espancado, quase terminei meus dias no hospital por causa das lesões, destruíram o meu ateliê, me aplicaram uma enorme multa tributária. Tudo sob ordens vindas não se sabe de onde. Não são apenas autoridades. Toda a imprensa chinesa não pode nem me criticar. Eles dizem a ela: "Não mencionem Ai Weiwei nem para dizer se ele é bom ou ruim".
Com a nova lei criminal, estão abrindo uma enorme brecha para deter pessoas e impor punições desumanas, que violam os acordos das Nações Unidas, segundo os quais ninguém pode ser levado secretamente por um governo.
Como isso beneficia o governo? No ano passado, várias pessoas foram detidas secretamente pela polícia. Depois que fui solto, entrevistei algumas delas. Fiquei curioso, porque eram apenas estudantes ou recém-formados, jovens nascidos nos anos 1980 e 1990.
Eles disseram que foram presos só porque retuitaram informações. Os tuítes não foram nem escritos por eles. Isso pode causar desaparecimentos por semanas. E muitos estão mentalmente doentes. As pessoas começam a ter crises psicológicas por causa desse tipo de tratamento.
Essa lei mostra como o governo é incapaz de lidar com opiniões diferentes e é rude ao destruir quem tenha um ponto de vista diferente.
Quando você foi preso, alguns governos criticaram publicamente a China. A pressão externa funciona?
A China está muito envolvida economicamente com o mundo. Se quiser sobreviver, tem de depender do Ocidente, de diversos países. Trata-se de um jogo de sobrevivência, eles precisam ouvir. Usar a desculpa de que esse tipo de argumento não afetará a China não passa de uma tentativa de se justificar para não participar [da pressão sobre a China].
Direitos humanos são um valor muito básico, é preciso denunciar até que não haja nenhum tipo de violação. Se os direitos são violados em qualquer país, toda a humanidade é agredida. Se acreditarmos nisso, não haverá dúvida, não haverá negociação, não haverá desculpa. Se alguém disser que não há efeito, está basicamente desistindo. Não acho que um país possa abandonar esse tipo de luta.
Você é um entusiasta da internet, mas seu blog foi bloqueado. É preciso dar nome e número de identidade nas redes sociais do país. Dá para controlar a internet?
Não. Tentaram de várias maneiras parar a internet, que é basicamente uma forma de sociedade civil, é um processo muito democrático. Obviamente, os chineses não têm nenhum poder, não têm direito de votar. Mas têm o poder da discussão e da comunicação, de compartilhar informação e expressar ideias. Isso nunca existiu na China antes da internet.
A China sabe que precisa se equiparar à competição, portanto a internet é necessária. Se pudessem pará-la, já teriam feito isso. É claro que eles construíram essa grande muralha virtual, têm milhares de policiais na internet. E tentam criar rumores e discussões para desviar a atenção.
Estão tentando assustar as pessoas ao exigir o uso de seus nomes verdadeiros. Mas, entre os jovens, muitos não têm medo, não têm nada a perder. Você só tem algo a perder se trabalha para o governo. Talvez menos gente vá se expressar, mas isso não vai parar as pessoas que querem falar.
Espero pelo dia em que me permitam registrar meu nome verdadeiro. Uso meu nome há anos. Se postar com meu nome verdadeiro, ele não vai aparecer na internet. Usei nome falso para aceitar doações, ficou na internet por menos de uma semana, mas conseguimos que 30 mil pessoas enviassem dinheiro, no total de mais de 9 milhões de yuans [R$ 2,6 milhões].
Você me fotografou com seu iPhone. Há grande controvérsia sobre as fábricas da Apple na China. O que pensa sobre isso, já que aparentemente é um grande fã da marca.
Não sou grande fã da Apple. Comecei a usar o iPhone porque tem essa câmera de alta definição e eu preciso dela. O iPhone é um exemplo interessante. Todos adoram o iPhone, a nova geração adora, mas, ao mesmo tempo, essas fábricas exploram países como a China. As pessoas não têm direitos básicos, não existe a proteção dos sindicatos. Portanto, é um tipo de escravidão, já que os trabalhadores não têm escolha.
Se alguém pula da janela e sacrifica a vida aos 20 anos, não há outra explicação. É escravidão. E não foi só um, foram 20 trabalhadores [que se suicidaram em fábricas de iPhone]. Para a Apple é facílimo fazer fábricas na China, ela tem 1 milhão de trabalhadores.
Não queremos só ser politicamente corretos. Tendo ou não iPhone, todos participamos do desenvolvimento moderno. Você não precisa ter um iPhone para participar da poluição, da burocracia. É por esse motivo que todos devem ser conscientes dos direitos humanos. Ninguém é totalmente limpo, nosso conforto está sempre relacionado ao sofrimento de alguém.
O seu pai é muito conhecido na China. Isso lhe dá abertura com funcionários do governo?
Não, nenhuma. O meu pai sempre lutou contra a injustiça. Há 80 anos, foi preso pelos nacionalistas [rivais dos comunistas na guerra civil dos anos 1940].
É irônico, mas também sinto orgulho de ter o mesmo ritmo. As épocas são bem diferentes, mas as condições são parecidas: liberdade de discurso, livre expressão das ideias.