A «palavra feia»
Por Rui bebiano, Blog A terceira noite
À volta das comemorações do dia 8 de março estão instalados três círculos de pseudo-apoiantes, mas reais adversários, que baseiam a sua atitude numa distorção da dimensão política do combate das mulheres pela igualdade. O primeiro, o mais visível, o mais poderoso também, transforma a data em instrumento de negócio, forçando os consumidores, homens ou mulheres, a despender dinheiro para oferecerem prendas que são afinal a figuração simbólica da própria subalternidade. Nada contra a compra de flores ou de tratamentos de beleza, obviamente, mas estes nada têm a ver com a luta pública das mulheres pelos seus direitos. O segundo círculo é mais insidioso, integrando os cidadãos, muitos deles mulheres, que consideram ter a emancipação completado já o seu caminho, ou atingido os seus limites, não havendo pois lugar a grandes causas ou preocupações. Uma atitude que faz baixar as guardas e pactua com os inúmeros casos de desigualdade e de ausência de direitos que permanecem uma constante fora de territórios sociais e culturais privilegiados.
Já o terceiro círculo, apesar de mais pequeno, é particularmente perigoso, dado poder funcionar como um cavalo de Tróia. Ele integra aquele grupo de pessoas que se declara pelos direitos das mulheres mas faz questão de se proclamar «não-feminista» ou mesmo «antifeminista». Neste campo pode encontrar-se um grande número de mulheres, algumas mesmo informadas e que se consideram emancipadas, muitas vezes em lugares de destaque, que exibem esta atitude por terem do feminismo, «palavra feia», da sua pluralidade e da sua história, bem como dos seus atuais combates, uma conceção caricatural. Será uma banalidade escrevê-lo, mas vale a pena repetir: não, ser feminista, não é «ser contra os homens», não é detestar que lhe ofereçam flores, não é odiar o espaço da casa, não é abominar a maternidade, não é usar botas cardadas, não é ser (necessariamente) lésbica ou promíscua, embora existam mulheres feministas que pratiquem ou sejam tudo isso, como existem pessoas, de esquerda ou de direita, que se diferenciam, e muito, de outras que partilham convicções políticas análogas. Um feminismo sem diversidade – e sem a pequena componente radical – seria aliás, ele sim, coisa de assustar. O Dia Internacional de Mulher evoca também, atualmente, a luta contra o preconceito e contra este triplo cerco.
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