Do coração e outros corações

Do coração e outros corações

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Ainda o "Regresso da Senhora Ching"do Blog RERUM NATURA Aqui


Contribuição recebida de Guilherme Valente:

Houve quem achasse excessivo o título do meu último artigo no Público(também colocado no DRN), «O Regresso da Senhora Ching» e o paralelismo de natureza entre a ideologia do «eduquês» e a Revolução Cultural maoísta. A esse propósito, achei interessante propor a leitura de um pequeníssimo fragmento (apenas um exemplo…) de «Testemunhos da Era Maoísta»,incluído na obra "Ensaios sobre a China" (editora Cotovia) , de Simon Leys, um grande sinólogo, fascinado pela civilização chinesa, que nunca confundiu o seu povo sofredor de uma irredutível humanidade com o regime comunista de Mao:
«Corolário desta exclusão imposta a todos os elementos socialmente impuros independentemente da boa vontade de que dêem provas: as pessoas "bem-nascidas" gozam, essas, de todos os favores. Que Proust proletário nos descreverá os mecanismos deste Jockey Club às avessas?

Como sempre, são os rebentos da "nova classe" que são os mais insuportáveis. O seu atrevimento e a sua arrogância não conhecem limites e, por si só, conseguiram transformar a vida dos professores num purgatório: actualmente, não há na China profissão mais ingrata e mais maldita que a de professsor.

H. .., que trabalhou vários anos em diversas escolas de Cantão como professor provisório, descreve-me esta experiência como um autêntico calvário.

Quanto mais impecável é a sua "linhagem", menos estes alunos se sentem obrigados a prestar atenção ao que se tenta ensinar-lhes. Seguros da sua impunidade, desafiam o professor, que não ousa repreendê-los com medo das represálias; efectivamente, todo aquele que tentasse impor-lhes a sua autoridade ver-se-ia imediatamente acusado de "reprimir a espontaneidade das massasrevolucionárias".

Assim que perdem o pé no seu trabalho escolar, denunciam o professor pelo seu "mandarinismo esotérico " ; o infeliz é aliás chamado à pedra pelo director da escola quando as quotas dos exames dessa bela juventude são demasiado medíocres: "O que é que lhe deu para perseguir estes filhos de proletários? É por causa da sua educação burguesa que julga que se pode permitir...", etc.

Durante bastante tempo, H... impôs a si próprio fazer graciosamente horas extraordinárias, indo a casa destes mariolas para lhes dar explicações e procurar mantê-los à tona ou repescá-los à força. Por fim, acabou por seguir o conselho cínico e sensato de um colega mais experiente:

"Se quer pôr fim aos seus problemas, é muito simples: eleve automaticamente as quotas de todas as crianças de 'boas famílias'... "

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